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Brasília, 19 de maio de 2021
Amigos, amigas, companheiros e companheiras, meus familiares,
Antes de tudo gostaria de dizer que serei eternamente grato a todas e todos pelo apoio recebido neste momento de extrema adversidade.
Na medida do possível, estou bem, mas por determinação da juíza da vara de execuções penais, estou impedido de falar em redes sociais ou quaisquer outros meios de comunicação sem autorização prévia, até mesmo para agradecer o carinho e apoio das pessoas.
Me sinto SUFOCADO com essa mordaça judicial!
E mais sufocado ainda , principalmente por não poder falar sobre todas as violações de direitos que já presenciei e que sigo acompanhando dentro do sistema.
Informo a vocês que o mesmo espancamento que sofri, as agressões verbais,as ameaças e as torturas psicológicas e físicas pelas quais passei por ser ativista de esquerda, eu também presenciei e ainda presencio as mesmas práticas em relação a outros apenados , e muitas das vezes, de maneira gratuita ou por mero sadismo das autoridades que as praticam.
Após passar pela “Papuda”, estou hoje no Centro de Progressão Penitenciária. Mas, mesmo no regime semi-aberto, presencio que, por parte de alguns agentes do sistema e principalmente por parte das chefias, quase tudo é motivo para insultos pessoais, ameaças de castigo ou regressão de regime a apenados.
Mais, as sanções ou castigos coletivos proibidos expressamente no parágrafo terceiro do artigo 45 da Lei de Execuções Penais, ocorrem cotidianamente e fazem parte da cultura do sistema penitenciário, tanto na “Papuda” (Regime Fechado) quanto no CPP (Semi-aberto).
Que modelo de reeducação é esta baseado apenas em ameaças,agressões e castigos ?
Que Centro de “Progressão” é esse em que ficamos dependendo da subjetividade e do humor de alguns agentes de determinado plantão para sermos acusados, julgados e sentenciados à castigos coletivos, individuais ou a regressão de regime por qualquer motivo ?
É Centro de Progressão ou a base de Guantánamo ?
É Centro de Progressão ou um campo de concentração nazista ?
Queridas e queridos, minha luta não se trata mais apenas da defesa do ativista político “Pilha”, mas sim, da defesa de toda e qualquer vida humana que se encontra hoje “custodiada” pelo estado.
Infelizmente, tiros, porradas e bombas de efeito moral e gás de pimenta em reeducandos sentados apenas de cueca nos pátios, com as mãos na cabeça e em posição de rendimento, ocorrem inclusive no CPP, e são no mínimo excesso de uso da força, para não dizer TORTURA!
Na última quinta feira (13/05/21), a direção do CPP juntamente com agentes de outra Força de Segurança de outro estado da federação, fizeram a título de “treinamento”, uma operação igual à supracitada, à noite na ala B do Bloco 1. Pois é, nós os reeducandos servimos como cobaias para treinamentos policiais . Está certo isto ?!
Resultado: Machucaram diversos internos e avisaram que em breve farão o mesmo na ala “A”, onde me encontro preso.
Para vocês terem idéia , a ala “B” é a ala dos estudantes e a ala “A”, a dos trabalhadores. Então, imaginem o que não ocorre na ala “H”, conhecida como “calabouço”, ou pior, nos pavilhões e blocos do regime fechado na “Papuda”!
Saibam, quando estive na “Papuda” e agora quando converso com detentos que chegam de lá para o regime semi-aberto, são diversos os relatos de espancamentos,torturas e até de presos que vieram a falecer pela truculência do DPOE, quando este agrupamento adentra os pátios para operar no que se costuma chamar de “bate-fundo” ou “geral”.
Enfim, se é verdade que há internos considerados de alta periculosidade ( E para isto existem os presídios e regimes de segurança máxima), mais verdade é,que mais da metade da massa carcerária não cometeu crimes contra a vida e NÂO são “Serial Killers” ou bandidos de altíssima periculosidade. E ainda se fossem, o que a lei penal prevê é apenas a privativa de liberdade, e não, o direito dos agentes do estado em insultar, ameaçar, espancar, mutilar, torturar e até matar!
Sim, existem alguns agentes policiais humanistas e que nos tratam com cordialidade e respeito, mas infelizmente são uma pequena minoria que também é oprimida por uma maioria de agentes abusadores e truculentos.
Queridos e queridas, se outrora sempre acreditei nas mães pretas das periferias e favelas que denunciavam o abuso da força e torturas policiais contra seus filhos reeducandos, lhes digo que pelo que estou vivenciando, hoje posso dizer que tenho a certeza de que estas SEMPRE falavam a verdade!
Portanto, ouçam, acreditem e acolham estas mães , sempre que estas denunciaram tais abusos e torturas, pois esta é a mais pura verdade,nua e crua, de um sistema penitenciário perverso, cruel e até criminoso.
Compas, lá dentro do sistema, vejo nos olhos de jovens, idosos, deficientes e demais pessoas com quem converso, muita vontade de estudar, trabalhar ou ter apenas uma oportunidade para não se envolverem mais com atitudes fora da lei.
Ou seja, no que muitos enxergam apenas o “lixo” da sociedade, vejo muitos corações e almas que mesmo dentro do “inferno” ainda mantém a esperança em voltar a ter uma vida sem envolvimento com crimes.
Repito, vejo DIVERSOS CORAÇÕES E ALMAS ESPERANÇOSOS mesmo dentro do INFERNO PENITENCIÁRIO !
Voltando ao “Pilha”, se os agentes que me espancaram e torturaram, pensaram que iriam me intimidar, mudar minhas convicções políticas, ideais e utopias , ou que iriam me calar através da violência covarde, pensaram mal e mexeram com o cara errado!
Pois agora é que o “Pilha” está ainda mais aguerrido e com muito mais vontade de lutar e defender a dignidade da pessoa humana, os direitos humanos e as utopias de construir um mundo mais justo e igualitário.
Despertaram no “Pilha” que sempre defendeu causas coletivas , a vontade de lutar por uma nova causa “particular e coletiva”, que é, a luta contra um sistema carcerário excessivamente punitivista, corrupto, ineficiente e apodrecido por práticas medievais, desumanas, covardes e criminosas!
Por fim, sei do risco que corro em falar tudo isto mesmo por carta, mas minha essência ativista e de militante forjado na luta, jamais me permitiria ficar calado diante de toda e qualquer injustiça e violação de direitos, até mesmo no “Inferno”.
Eu seria um covarde e não teria coragem de me olhar no espelho, após sentir tais mazelas na própria pele ,ver toda esta podridão do sistema penitenciário e ficar calado por medo de retaliações e perseguições.
Prefiro o risco da dignidade da luta, a me pôr de joelhos diante dos “poderosos” e coniventes com um sistema penitenciário dispendioso, violento, ineficiente, covarde, falido, e acima de tudo, INJUSTO !
Aconteça o que acontecer, JAMAIS VOU ME CALAR DIANTE DE INJUSTIÇAS !
E antes que eu me esqueça, FORA BOLSONARO GENOCIDA !
Há braços de luta.
Com carinho e gratidão eterna,
Rodrigo Pilha
SAIBA MAIS …
Chutes e murros no ‘vagabundo petista’: Rodrigo Pilha foi torturado na prisão, aponta revista
Detido em 18 de março após participar de protesto com a faixa “Bolsonaro Genocida”, Pilha, assim que entrou pelo pátio do presídio, já era esperado por agentes que perguntavam a todos os custodiados “quem era o petista”, de acordo com reportagem
Publicado 30/04/2021 – 11h34
Reprodução
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Revista Fórum confirma que o ativista foi espancado no pátio e na cela do Centro de Detenção Provisória, em Brasília. Relatório médico constata hematomas
São Paulo – Reportagem do editor da revista Fórum, Renato Rovai, publicada nesta quinta-feira (29), confirma que o ativista Rodrigo Grassi Cademartori, conhecido como Rodrigo Pilha, foi torturado e espancado no Centro de Detenção Provisória (CDP) II de Brasília. Ele ficou 14 dias preso no local, até ser transferido para o Centro de Progressão Penitenciária (CPP), também no Complexo Penitenciário da Papuda.
As agressões tiveram início logo na chegada de Pilha ao CDP II, a área mais conhecida como “Covidão”, por separar os internos recém-chegados ao sistema prisional para cumprir quarentena por 14 dias. Detido em 18 de março após participar de protesto com a faixa “Bolsonaro Genocida”, Pilha, assim que entrou pelo pátio do presídio, já era esperado por agentes que perguntavam a todos os custodiados “quem era o petista”.
Identificado, Pilha foi recepcionado com chutes, pontapés e murros enquanto ficava no chão sentado com as mãos na cabeça, segundo a Fórum, que apurou os detalhes da denúncia de agressão que já havia sido divulgada pela RBA, em 12 de abril, com base em informações do jornalista Guga Noblat, que obteve os autos do processo.
A reportagem descreve que “enquanto Pilha estava praticamente desmaiado, o agente que o agredia, e do qual a família e advogados têm a identificação, perguntava se ele com 43 anos não tinha vergonha de ser um vagabundo petista”. O agente ainda dizia que “Bolsonaro tinha vindo para que gente como ele tomasse vergonha na cara”, cita o veículo.
Mais tortura
A sessão de tortura continuou à noite, quando o ativista já estava na cela. De acordo com Rovai, os mesmos agentes foram fazer uma blitz no local e deixaram todos os detentos nus, enquanto os agrediam com chutes e pontapés. “Com Pilha, foram mais cruéis. Esparramaram um saco de sabão em pó na sua cabeça, jogaram água e depois o sufocaram com um balde. Todos foram avisados que estavam sendo agredidos por culpa de Pilha. Do petista que não era bem-vindo na cadeia”, relata.
Ainda detido no CPD II, Pilha reclamou de lesão contusa no membro superior direito e coxa direita e foi atendido no dia 23 de março. Um relatório médico constatou equimose ao exame clínico, um diagnóstico semelhante a hematomas e que indica a presença de manchas na pele geralmente provocadas por traumas. O documento também faz parte do inquérito.
Durante os dias em que ficou preso na detenção provisória, o ativista contou com a solidariedade dos companheiros de cela, que dividiram com ele roupas e alimentos. Atualmente, o ele cumpre pena no CPP em regime semiaberto, trabalhando no período da manhã. Sua defesa, contudo, ainda tenta conseguir progressão de pena, mas vêm encontrando uma série de entraves.
Prisão política de Rodrigo Pilha
Apesar das dificuldades, juristas renomados do país denunciam que a prisão de Pilha é unicamente “política”. Eles apontam que a manutenção do cárcere é baseada em um processo de desacato de 2014, uma infração que não prevê restrição de liberdade. Com as novas denúncias de tortura e espancamento, o temor dos famílias e dos advogados é que a vida do ativista esteja em risco.
PeloTwitter, o humorista, escritor e ator Gregório Duvivier comentou o caso. “Sei que nada mais nos choca. Que estamos batendo 400 mil mortes. Mas isso é abjeto demais. Não pode passar batido. Sua prisão já é criminosa. O que aconteceu lá dentro é hediondo. Liberdade pra Rodrigo Pilha. Cadeia pros torturadores”, escreveu.
Ao compartilhar a notícia na edição desta sexta (30) do Jornal Brasil Atual, a jornalista Marilu Cabañas também repudiou os novos detalhes do processo político. “É uma grave denúncia. Quis fazer esse apelo para que as pessoas se solidarizem e entrem nessa força para a gente tentar tirar o Pilha da prisão. Inadmissível esse tipo de tortura e agressão.”
Comissão na Câmara pede “apuração imediata”
A presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) solicitou hoje que o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) instaure apuração da denúncia de agressões contra Rodrigo Pilha.
O documento é assinado pelos deputados Carlos Veras (PT/PE), presidente da CDHM, e Érika Kokay (PT/DF), 2ª vice-presidente. Nesta sexta-feira, está prevista uma reunião da deputada Érika Kokay com a juíza Leila Cury, da Vara de Execuções Penais, para tratar da questão.
A RBA procurou a Secretaria de Administração Penitenciária (Seape) do Distrito Federal para questionar as denúncias e aguarda o posicionamento do órgão.
Redação: Clara Assunção
fonte: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2021/04/rodrigo-pilha-foi-torturado-prisao-aponta-revista/