Por nenhum direito a menos

O caçique Damião Paridzané, líder do território Maraiwatsede, fala sobre a pavimentação dentro das terras indígenas.

A reportagem é de Ivanis Tiburcio, publicada por Prelazia de São Félix, 16-03-2021.

Conhecendo a BR 158

BR-158 interliga o Norte e o Sul do Brasil cortando 8 estados; 800km dessa rota estão dentro do estado do Mato Grosso. A rodovia é de extrema importância para todo estado uma vez que é a principal via de escoamento da safra; vale lembrar que o Mato Grosso é um dos principais produtores de grãos e cana-de-açúcar do país e um dos maiores criadores de bovinos.

Aproximadamente 128 km da Rodovia Federal não estão asfaltados por passar dentro de Terra Indígena de propriedade dos Xavantes, garantida por Lei depois de muita luta, o território Marãiwatsédé. Na rodovia trafegam, diariamente, milhares de veículos leves e pesados, a grande maioria caminhões pesados que ajudam a piorar a situação da estrada que já é bastante precária. Em tempos de chuva tem-se grandes atoleiros ao longo dos 128 km de estrada de chão e, no tempo da estiagem, muita poeira, dificultando, assim, a visibilidade dos motoristas, o que torna o local palco de inúmeros acidentes. É um sonho para muitos que dependem da BR, o asfalto; estes pedem para que a pavimentação da estrada seja de imediato; para os donos do território, no entanto, pensar nessa possibilidade é um pesadelo.

 

Indígenas do território Marãiwatsédé (Foto: Prelazia de São Félix)

O líder do Território, preocupações, apoio e solidariedade

O cacique Damião Paridzané convidou a Prelazia de São Félix para ouvi-lo sobre a atual situação da rodovia e ajuda-los a transmitir uma mensagem que considera ser de interesse público, pois, alguns profissionais de Comunicação têm ido em busca de informações, mas, em suas matérias, modificam falas, comprometendo a seriedade da questão e manchando a imagem dos índios. São veiculados muitos conteúdos que não representam o pensamento das 11 aldeias que compõem o território. Diante dessa situação, Dom Adriano Ciocca Vasino, Bispo Prelado de São Félix do Araguaia, enviou a equipe da Pastoral da Comunicação da Prelazia até a localidade onde reside o cacique para ouvi-lo, bem como aos demais indígenas, a fim de ajuda-los no repasse de informações corretas a quem for de interesse.

Neste artigo seguem fidedignas informações de acordo com o pensamento e as falas do líder do território, que podem ser vistos através de filmagens feitas ao longo da entrevista. Os A’wẽ Uptabi, conhecidos como Xavantes, são um povo indígena que vive na região Leste de Mato Grosso, em terra indígena, onde passam os 128km de rodovia da BR-158. Desde quando se falou de pavimentar a rodovia, a população indígena, demonstrou preocupação e disse não ser de acordo pois afetaria, mais uma vez, as suas terras.

Cacique Damião afirma que inúmeras reuniões foram feitas e que não os convidaram ou tão pouco os comunicaram, sendo que são eles os principais interessados na questão. O cacique diz: “Sem dúvidas compreendo a necessidade de crescimento das cidades da região e a economia, mas estas manobras só servem para fortalecer os políticos” (SIC). O mesmo chamou de “manobra” o fato de, nestas reuniões, as decisões nunca levarem em consideração a opinião e o bem-estar da população que habita o território. Refere também que as autoridades sabiam da ilegalidade de fazer a pavimentação dentro das terras por não haver as devidas Licenças Ambientais.

Damião enxerga tal ação como abusiva e desrespeitosa, pois reconhece-se como um homem de diálogo e afirma que nunca fez ameaça a nenhum motorista, caminhoneiro e nem a quem trabalha nas estradas, como fora veiculado em certas mídias para denegrir a imagem dele e de outros líderes. Refere que alguns políticos insistem em querer retomar a pauta de recapear o território indígena e o cacique do território junto dos demais caciques das 11 aldeias dizem “NÃO”; salienta que esta é a última decisão e que não tem mais conversa sobre este assunto.

Cacique Damião diz que não vê a hora do contorno ficar pronto para a “Mãe Terra” voltar a se recuperar, pois a quantidade de lixo jogado na natureza o entristece. Diz também que em outras terras indígenas pelas quais passaram estradas com asfalto, ocorreram acidentes e mortes de indígenas, pois há um aumento na velocidade com que os veículos circulam e imprudência por parte dos motoristas, e que não deseja perder nenhum dos seus. A FUNAI (Fundação Nacional do Índio), o CIMI (Conselho Indigenista Missionário), a SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena) e outros órgãos estão de acordo com a decisão dele, afirma.

No vídeo abaixo o Cacique Damião faz um apelo ao DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e ao poder público para que a verba seja liberada o quanto antes a fim de que as pessoas tenham uma nova opção com estradas melhores, assim como foi acordado; refere nunca ter sido intenção, tanto sua, quanto dos demais índios, prejudicar ninguém, mas proteger o território que, para eles, é solo sagrado, pelo qual nutre amor e onde deseja preservar sua cultura e de seus antepassados.

Aproveitando o ensejo, agradeceu a Dom Adriano Ciocca pela rápida resposta, e a todos que estão na luta ao seu lado. O encontro foi concluído com uma manifestação cultural que pode ser conferida no vídeo. Preservar a cultura indígena é estar ao lado dos índios, sem dúvida, e garantir que este Bem Imaterial da Humanidade perdure.


 

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fonte: http://www.ihu.unisinos.br/607606-por-nenhum-direito-a-menos

 

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