Paraguai continua agindo contra os direitos humanos para esconder sequestro e tortura. Solidariedade a Cristina Arrom

 


 

Jueza ordena captura de Cristina Arrom por no presentarse a juicio oral

La jueza Cándida Fleitas decretó este viernes la rebeldía y dispuso la captura de Cristina Arrom, quien no se presentó al juicio oral por la acusación del ministro Esteban Aquino, por difamación, calumnia e injuria.

  

Cristina Arrom, hermana del prófugo Juan Arrom, no se presentó al juicio oral en el que se la acusa por difamación, calumnia e injuria, por lo que la magistrada dispuso su captura, informó el periodista de Última Hora Raúl Ramírez.

Lea más: Justicia admite querella contra Cristina Arrom

Cristina Arrom había vinculado a Aquino en la desaparición de su hermano Juan en enero de 2002, donde estuvieron involucradas las fuerzas del Estado.

La mujer alegó que supuestamente él la siguió cuando se dirigía, junto con su hermana, a la vivienda donde estaban tanto Juan como Anuncio Martí. Las declaraciones se dieron ante la Corte Interamericana de Derechos Humanos (Corte IDH).

Lea además: Acnur analizará protesta de Paraguay por caso Arrom, Martí y Colmán

La querella pide G. 850 millones como compensación por el daño ocasionado.

El caso había sido desestimado por el juez de Sentencia Víctor Alfieri, luego de un pedido de la propia Corte IDH. Sin embargo, el Tribunal de Apelación en lo Penal, Segunda Sala, anuló la sentencia que desestimaba la querella.

fonte: https://www.ultimahora.com/jueza-ordena-captura-cristina-arrom-no-presentarse-juicio-oral-n2932397.html

 


SAIBA MAIS

OS TERRORISTAS DE MORO

Os detalhes do processo contra ativistas paraguaios que Bolsonaro e Moro querem expulsar do Brasil

 
 
Ilustração: DAPENHA/The Intercept Brasil

No fim de julho, Jair Bolsonaro e seu ministro da Justiça, o ex-juiz Sergio Moro, foram ao Twitter comemorar que três paraguaios radicados no Brasil desde 2003 haviam perdido oficialmente a condição de refugiados, abrindo caminho para o trio ser extraditado. Juan Arrom, Anuncio Martí e Victor Colmán são acusados pelo governo do Paraguai de serem guerrilheiros de esquerda – perfil ideal para serem exibidos como “troféus” do bolsonarismo no combate a imigrantes, refugiados e esquerdistas. Para o governo, eles são terroristas.

A versão dos paraguaios, no entanto, é a de que eles são perseguidos políticos — que chegaram a ser sequestrados e torturados por policiais e agentes de inteligência do governo do Paraguai. A revisão do refúgio, que teve participação de Moro em seu ato final, deixa indícios de que o caso teve um caráter muito mais político do que técnico — inclusive com articulação pública entre Bolsonaro e o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, o Marito. Enquanto discutiam abertamente o caso do trio, Bolsonaro e Marito negociavam em segredo um novo acordo sobre Itaipu que traria prejuízo ao Paraguai – um escândalo denunciado por mensagens vazadas que derrubou o chanceler paraguaio e quase rendeu um impeachment para Marito por traição.

 

Quando Bolsonaro se tornou o novo presidente do Brasil, Marito sabia que teria um aliado – e Martí, Arrom e Colmán seriam uma das razões dessa aproximação. No dia seguinte ao segundo turno da eleição no Paraguai, em 29 de outubro do ano passado, instantes depois de atender a uma ligação do brasileiro recém-eleito, Marito anunciou pelo Twitter que pediria a Bolsonaro a revogação do refúgio e a consequente extradição dos paraguaios para que prestassem conta de seus atos à justiça do Paraguai.

Eleito pelo Partido Colorado, Marito é filho de Mario Abdo Benítez (sim, o mesmo nome), que, por anos a fio, foi secretário pessoal de Alfredo Stroessner, longevo ditador paraguaio — a quem Bolsonaro posteriormente classificaria como “grande estadista”. Para muito além da troca de afagos em redes sociais, Marito foi um dos poucos chefes de estado que prestigiaram a posse do brasileiro. O caso dos refugiados foi, desde então, um tema recorrente entre os dois.

 
Os detalhes do processo contra ativistas paraguaios que Bolsonaro e Moro querem expulsar do Brasil1 page

Em janeiro, o governo do Paraguai voltou a dizer publicamente que pediria a extradição de Arrom, Martí e Colmán. Em 12 de março, durante a primeira visita oficial do presidente paraguaio ao Brasil, Marito e Bolsonaro trataram pessoalmente do caso. Ao fim da reunião, o brasileiro disse que não daria “asilo a terroristas ou a qualquer outro bandido escondido no manto de preso ou refugiado político”. É como se a decisão em relação a Arrom, Martí e Colmán já tivesse sido tomada. Menos de dez dias depois, o processo de revisão do refúgio foi instaurado e tramitou rápido. O refúgio dos três foi oficialmente cancelado pelo governo brasileiro quatro meses depois de iniciado. A portaria final foi assinada por Moro, que celebrou a medida no Twitter – o Brasil “não é terra sem lei”. Enfim, ele e Bolsonaro exibiam seus troféus.

paraguaios_miolo_01-1566151436

Ilustração: DAPENHA/The Intercept Brasil

Contradições de um sequestro

NO BRASIL, OS TRÊS REFUGIADOS viveram no Paraná. Martí, de 57 anos, é jornalista, escritor e poeta, casado com uma refugiada paraguaia e tem dois filhos — a mais nova é uma menina de sete anos nascida no Brasil. Arrom, também de 57 anos, é cientista político e faz mestrado na Universidade Federal do Paraná. É casado com uma paraguaia e tem três filhos — entre eles, uma adolescente brasileira de 14 anos. Colmán, 54 anos, é dono de uma pequena confecção. Mora em Curitiba, com a mulher, uma enteada e um sobrinho.

No passado paraguaio, os três eram líderes do Patria Libre, o PPL, partido de esquerda fundado em 1990 e ligado a movimentos estudantis. Eles são acusados pelo governo paraguaio de terem participado do sequestro de Maria Edith de Debernardi, ocorrido em 16 de novembro de 2001. Nora de um ex-diretor da Itaipu Binacional, a refém foi libertada após o pagamento do resgate de US$ 1 milhão, segundo informações repassadas pela família e que constam do processo. Ela deixou o cativeiro após 64 dias de sequestro, em 19 de janeiro de 2002.

Em liberdade, Debernardi disse, em juízo, que não seria capaz de reconhecer os sequestradores, já que os integrantes do bando usavam capuzes. Quinze dias depois, no entanto, quando o governo do Paraguai já atribuía publicamente o crime a membros do Patria Libre, ela voltou e “reconheceu” Arrom e Martí como dois dos bandidos que a mantiveram em cativeiro. Segundo Debernardi, Martí seria, aliás, “o guarda mau”, que a ameaçava com uma metralhadora.

 
Os detalhes do processo contra ativistas paraguaios que Bolsonaro e Moro querem expulsar do Brasil9 pages

Arrom e Martí negam participação no sequestro. E apresentaram um álibi: dois dias antes de a refém ser libertada, em 17 de janeiro de 2002, a dupla também estava em cativeiro. Os dois dizem que foram sequestrados, depois de terem sido atraídos a uma falsa reunião agendada por um assessor do Ministério do Trabalho do Paraguai. O álibi foi analisado pelo Comitê Nacional para Refugiados, o Conare, do Ministério da Justiça brasileiro. No pedido que embasou o refúgio para o Brasil, o comitê atestou que ambos foram “barbaramente torturados” para que assumissem o sequestro de Debernardi e que dissessem publicamente que estavam associados às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, as Farc. Eles permaneceram em cárcere privado por 14 dias, de acordo com o relato dos paraguaios feito ao Conare.

O relatório aponta que, no mesmo dia em que Debernardi foi libertada, a casa de Colmán foi invadida por 26 policiais armados. O militante do Patria Libre teria sido torturado física e psicologicamente por 45 minutos. Em seguida, ele, sua mulher e seu cunhado seriam presos pelos próximos seis meses. Conforme o processo, “na prisão, [Colmán] recebeu a informação de que permaneceria no cárcere por 25 anos, porém, poderia reduzir este tempo para cinco anos se confessasse a sua participação no sequestro [de Debernardi]”.

Intercept teve acesso com exclusividade aos exames de saúde realizados assim que Arrom e Martí foram libertados do cativeiro. Com pequenas variações, ambos foram diagnosticados com “ferimentos na cabeça, abdômen, genitais externos e membros inferiores”. O laudo dos dois é documentado com fotos, que mostram feridas profundas, abertas nos pulsos (provocadas por objetos contundentes, provavelmente algemas) e hematomas no tórax, costas e nádegas (no caso de Arrom) e no rosto (no caso de Martí).

FOTO-1.-Torturas-no-pulso-3-1566154004
 
Marcas-das-torturas-no-Torax-1566153720
Marcas-torturas-quadris-costas-1566153773

Anexadas ao laudo médico, fotos mostram ferimentos no pulso, tórax e quadris de Martí e Arrom.Fotos: Reprodução/Laudo médico

Eles relataram aos médicos terem sido submetidos a sessões de espancamento (chutes, murros, coronhadas ou golpes com cassetetes), asfixia ou afogamento “em água contaminada”, além de terem sofrido constantes ameaças de morte. Segundo os exames, Arrom e Martí apresentavam também traumas psicológicos, como crises de choro e desorientação espaço-temporal. Outro laudo que consta do processo, datado de janeiro deste ano, revela que, ainda hoje, os dois sofrem de terror, angústia, elevados níveis de estresse e sensações contínuas de flashback, situação em que a pessoa rememora o trauma que experienciou.

Arrom e Martí só foram libertados depois que vizinhos do cativeiro desconfiaram da movimentação e avisaram familiares dos então desaparecidos. O resgate foi acompanhado ao vivo pela imprensa, que noticiou amplamente a libertação dos militantes.

O episódio deflagrou uma crise interna no governo do então presidente Luis Ángel González Macchi, do Partido Colorado. Policiais e o chefe do Ministério Público chegaram a ser presos, enquanto o governo se viu obrigado a destituir dois ministros. Pouco depois, sobraria para o próprio presidente: González Macchi e o procurador-chefe da República, Oscar Latorre, enfrentaram processos de impeachment por causa do episódio e denúncias de corrupção, escapando por poucos votos.

Entre as autoridades paraguaias diretamente envolvidas nas denúncias de tortura está o procurador Hugo Velázquez, hoje vice-presidente do Paraguai. No documento do Conare, conta que Velázquez era o agente fiscal que analisava os documentos da investigação. Neste ano, ele classificou as acusações de tortura contra que recebeu como “mentiras payasescas [relativas a palhaços]”.

jornal-0-1566152951

‘Terrorismo de estado’: jornal da época noticia o resgate de Arrom e Martí.

 

Foto: Reprodução/Última Hora

O refúgio

À ÉPOCA, ARROM, MARTÍ E COLMÁN também pagaram seu preço. Mesmo acossado pelas denúncias de tortura, o governo paraguaio manteve as acusações contra os três militantes, sustentando a narrativa de que eles teriam participado do sequestro de Debernardi. Segundo a defesa, após ter sido libertado do cativeiro, mesmo com toda proporção que as denúncias de tortura ganharam, Arrom voltou a ser preso. Passou um mês na cadeia. Colmán, por sua vez, ficou detido por seis meses.

A defesa dos paraguaios diz que, em 2003, quando conseguiram a liberdade por meio de um habeas corpus, Arrom e Colmán se juntaram a Martí, mudaram-se para o Brasil e entraram com um pedido de refúgio. Justificaram risco de vida, liberdade e segurança “devido à sistemática perseguição de que somos objeto no Paraguai, por motivos ideológicos e políticos”. O Conare, vinculado ao Ministério da Justiça, acolheu o pedido. Com isso, o processo criminal que tramitava no Paraguai contra os três — em razão da acusação de terem participado do sequestro de Debernardi — foi suspenso.

 
Os detalhes do processo contra ativistas paraguaios que Bolsonaro e Moro querem expulsar do Brasil19 pages

Ao longo dos anos seguintes, o Paraguai — tanto no período governado pelo Partido Colorado quando pela oposição — ignorou as evidências apresentadas pelo trio e não desistiu da caçada aos ativistas. Arrom, Martí e Colmán tiveram as cabeças postas a prêmio, com a oferta de uma recompensa de 500 milhões de guaranis (cerca de R$ 325 mil) por informações que levassem à captura dos militantes de esquerda. Cartazes com fotos dos três, ao lado de outros “procurados”, foram distribuídos pelo país vizinho.

Cartaz de procurados onde Arrom, Martí e Colmán aparecem ao lado de líderes das Farc.

Cartaz de procurados onde Arrom, Martí e Colmán aparecem ao lado de líderes das Farc.

 

Foto: Reprodução

O Paraguai pediu três vezes a revisão do status de refugiado dos militantes do Patria Libre: em 2004 e 2006 (quando a presidência estava nas mãos do conservador e quase hegemônico Partido Colorado) e em 2010 (com o governo sob a Frente Guasú, de centro-esquerda). Em todas, o governo paraguaio insistia na tese de que eles seriam “terroristas” e ligados ao Ejército del Pueblo Paraguayo, o EPP, grupo guerrilheiro de extrema esquerda, e que teriam relações com as Farc. Como provas, o Paraguai apresentava recortes de matérias de jornais — que mencionavam como fontes membros do próprio governo — e supostos e-mails trocados entre os três refugiados e integrantes da guerrilha colombiana.

Todas essas investidas do governo paraguaio, no entanto, foram rejeitadas pelo Conare, que nem sequer chegou a instaurar procedimento de revisão da concessão de refúgio. Além de considerar que a segurança de Arrom, Martí e Colmán estaria comprometida casos eles fossem extraditados, o conselho apontou que nunca houve provas de que eles atuaram junto a grupos guerrilheiros. Os tais e-mails anexados ao processo consistiam em um arquivo aberto (em formato de Word), que poderia ter sido manipulado ou forjado. Pela mesma razão, os e-mails já tinham sido declarados nulos para efeito de prova pela Suprema Corte da Colômbia.

Em setembro de 2017, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a CIDH, denunciou o Paraguai por violar direitos jurídicos e pessoais de Arrom, Martí e Colmán e por descumprir tratados internacionais sobre tortura. “Os elementos probatórios que constam deste expediente são consistentes entre si e demonstram que Juam Arrom e Anuncio Marti tiveram um intenso sofrimento físico e mental”, diz o relatório. A conclusão foi de que as investigações conduzidas pelo Ministério Público paraguaio foram parciais, com participação de agentes de estado.

 
Os detalhes do processo contra ativistas paraguaios que Bolsonaro e Moro querem expulsar do Brasil44 pages

Em 45 páginas, o relatório da CIDH recomendava ao Paraguai que reparasse integralmente as violações sofridas pelo trio “tanto no aspecto material quanto no imaterial”, que incluía o pagamento de serviços médicos para “atenção médica e mental necessárias” para a reabilitação dos, então, refugiados.

Neste ano, no entanto, o jogo virou.

paraguaios_miolo_02-1566151745

Ilustração: DAPENHA/The Intercept Brasil

O novo pedido

QUANDO MARITO E BOLSONARO começaram as conversas e sinalizaram a aproximação ideológica, Arrom, Martí e Cólman já sabiam que seu status de refugiados corria risco. Suas advogadas, Caroline Godoi e Fabiola Colle, entravam em fevereiro com um mandado de segurança junto à Justiça Federal, em Brasília, tentando impedir que o Conare cancelasse o refúgio. Perderam.

O Conare instaurou em 21 de março um processo para a cessação do abrigo de Arrom, Martí e Cólman. Além das acusações de que os três seriam terroristas e que respondiam a um processo por sequestro, o Paraguai apresentou um único argumento novo: o fato de, em outubro de 2018, o trio ter ajuizado um habeas corpus na justiça paraguaia, pedindo o arquivamento do processo, em razão de prescrição. Para o governo paraguaio, o fato de os refugiados terem recorrido à justiça era um reconhecimento de que a “situação objetiva” do país havia mudado. Logo, não haveria mais razões para a manutenção do refúgio aos militantes. Em abril, a Corte Interamericana de Direitos Humanos deu o ok para o Paraguai solicitar o fim do refúgio.

‘No meu país os torturadores estão soltos e estão no governo.’

Em maio, Martí e Colmán apresentaram sua defesa ao Conare. Argumentaram que, conforme diretrizes nacionais e internacionais, o refúgio só poderia ser cessado se eles quisessem. As advogadas acrescentaram, ainda, que o pedido de habeas corpus foi apresentado à justiça do Paraguai como um “remédio constitucional” para tentar pôr um fim à série de perseguições que eles vinham sofrendo por parte do governo do país. Entidades de defesa dos migrantes, como a Acnure Instituto Migração e Direitos Humanos também se manifestaram pela manutenção do refúgio aos militantes do Patria Livre.

Em um vídeo gravado para ser apresentado aos membros do Conare, Martí fala sobre como os reflexos da tortura e a perseguição política afetaram toda sua família e os colocava em risco:

“O Estado paraguaio nos negou a justiça e a paz que desejamos e buscamos. Senhoras e senhores, nesses 16 anos de refúgio, eu aprendi a amar o Brasil. O Brasil de meus filhos, o Brasil no qual eu quero continuar vivendo com minha família, pois no meu país os torturadores estão soltos e estão no governo e na impunidade. Ali não temos segurança alguma. Minha vida e a de minha família correm riscos no meu país, na atual conjuntura”, disse.

Em maio, o relatório da CIDH foi apreciado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que se reuniu em Buenos Aires. Marito Abdo Benítez foi ao julgamento e, antes da sessão, publicou uma foto no Twitter, em que aparece sorridente, ao lado de membros da Corte. Desta vez, os ativistas paraguaios foram derrotados: os juízes arquivaram o processo e, por unanimidade, absolveram o Paraguai das denúncias de participação no sequestro e torturas do trio.

Dez dias depois, por cinco votos favoráveis e uma abstenção, o Conare determinou o fim do refúgio de Arrom, Martí e Cólman, acatando o parecer do coordenador do conselho, Bernardo de Almeida Tannuri Laferté, que é subordinado ao Ministério da Justiça. Em sua argumentação, Laferté apontou que o Paraguai seria, hoje, um Estado de Direito, com Poder Judiciário independente e em que as instituições funcionam. Os demais membros não se manifestaram nem justificaram à adesão ao parecer do coordenador.

“Parece-nos estar diante de uma situação onde não mais a proteção internacional, conferida por intermédio do instituto do refúgio, se faz presente, tendo em vista a atual ausência de fundado temor de perseguição – elemento este que objetivamente não mais se configura no presente caso”, escreveu Laferté.

A defesa dos militantes diz que a absolvição do Paraguai não interfere na condição de refugiados do trio. “A sentença não questionou as torturas e desaparecimentos forçados sofridos pelos refugiados”, escreveram Caroline Godoi e Fabiola Colle, por e-mail. “Para ser cabível a proteção do refúgio, o agente perseguidor não precisa ser, necessariamente, o Estado. A legislação fala em ‘fundado temor de perseguição’”. Elas mencionam o manual da Acnur, que considera perseguição “atos discriminatórios graves ou outros atos ofensivos cometidos pela própria sociedade”, sobretudo se forem cometidos com a anuência das autoridades.

As advogadas recorreram da decisão de Moro, mas em vez de o próprio ministro analisar o pedido, como determina o artigo 29 do Estatuto dos Refugiados brasileiro, o recurso foi novamente analisado por Laferté — que é quem já tinha redigido o parecer pela cessação do refúgio. O coordenador do Conare manteve a condenação. Em seguida, Moro acolheu a análise de Laferté e, por fim, tirou o status de refugiado dos paraguaios em 22 de julho. Com isso, Arrom, Martí e Colmán perderam oficialmente a proteção do estado brasileiro.

13/08/2019 Solenidade de Condecoração de Comendas da Ordem do

Três dias depois da cassação do refúgio dos paraguaios, Sérgio Moro publicou a Portaria 666, que prevê “deportação sumária” de “pessoa perigosa para a Segurança do Brasil”. 

Foto: Alan Santos/PR

 

A polícia federal bate na porta

A DEFESA DOS MILITANTES PARAGUAIOS não tem dúvidas de que a condição de refúgio de Arrom, Martí e Colmán foi cessada por motivos políticos. As advogadas apontam a rápida tramitação e a atuação de Moro como elementos decisivos, que pesaram na decisão do Conare.

Elas recorreram duas vezes e ainda aguardam a decisão final. Também pediram a nulidade do processo do Conare na Justiça Federal, alegando que não há motivos para o fim do refúgio. Por fim, entraram com um pedido de habeas corpus preventivo contra qualquer ordem de prisão contra os paraguaios. Não há previsão para que o Supremo Tribunal Federal julgue o caso.

Segundo a defesa, quatro dias depois da decisão do Conare policiais federais começaram a aparecer nas casas dos paraguaios. A justificativa era notificá-los da decisão. Antes disso, no feriado de Corpus Christi, em 20 de junho, eles relatam que a polícia invadiu a casa de Arrom, em Curitiba, e de Martí, em Antonina, no Litoral do Paraná. Segundo a advogada dos paraguaios, mesmo sem mandado judicial, fez buscas, revistando armários e cômodos da casa. No caso de Martí, um agravante: policiais chegaram a apontar uma arma para um familiar dele e fotografaram documentos pessoais.

‘Quatro agentes pularam o muro e violentamente bateram à porta, e também sem mandado, fizeram uma vistoria na residência.’

“Quatro agentes pularam o muro e violentamente bateram à porta, e também sem mandado, fizeram uma vistoria na residência. Os policiais ordenaram a uma das familiares [de Martí], que ficasse sentada na sala, apontando para ela uma arma e impedindo-a que entrasse no quarto e acalmasse a filha do casal, que estava chorando e assustada com a situação; além de terem pedido uma cópia de seu documento de identificação, o qual fotografaram, e de terem dito que seria melhor para Anuncio [Martí] e sua família que ele se entregasse à polícia, em uma flagrante e descabida ameaça”, consta do relato das advogadas, que foi encaminhado ao Conare e a entidades de defesa dos migrantes, como denúncia de arbitrariedade. Elas destacam que, conforme parecer do próprio Conare, as notificações deveriam ser feitas às próprias advogadas.

Questionei a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba a respeito das denúncias de violações cometidas pelos agentes em 31 de julho. Até a publicação desta reportagem, não houve resposta.

Após a decisão do Conare, os três paraguaios não foram encontrados em nenhuma das investidas da Polícia Federal. Alegando questões de segurança, as advogadas não dão informações que possam remeter ao paradeiro dos três, nem sequer se elas têm conseguido se comunicar com os clientes. Em 29 de julho, a revista Veja noticiou que o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, teria determinado a prisão de Arrom, Martí e Colmán, em decisão sigilosa. Questionado por telefone e e-mail, o STF não confirmou.

Segundo a Interpol, os três estão no Uruguai. A prova seria um ofício expedido em 29 de julho pelo chefe do departamento da Interpol de Assunção, Luiz Alberto Benítez López, informando que recebeu um comunicado da Interpol de Montevidéu, que apontava que Arrom, Martí e Colmán estariam em solo uruguaio.

No dia 25 de julho, três dias depois da cassação do refúgio dos militantes paraguaios, o ministério da Justiça publicou a Portaria 666, que pode levar a novos processos contra refugiados. Assinada por Sergio Moro, ela abre caminho para a “deportação sumária” de “pessoa perigosa para a Segurança do Brasil”, de suspeitos de envolvimento em terrorismo ou grupo criminoso organizado, entre outros.

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal, recomendou a Moro que revogue a portaria. Na avaliação do órgão, a norma estabelecida pelo ministro incorre em “integral e flagrante ilegalidade e incompatibilidade com normas de tratados internacionais de direitos humanos firmados pelo Estado brasileiro”.

Por sua redação que abre margem para interpretações subjetivas – principalmente, a partir da inclusão do termo “suspeitos” –, a Portaria 666 poderia ser aplicada no caso de Arrom, Martí e Colmán. A defesa dos paraguaios lembra das manifestações públicas de Bolsonaro, Moro e Marito Abdo – que classificaram os ex-refugiados como “terroristas” – e manifesta receio de que esse tom de discurso possa ter sido usado para legitimar ações mais rápidas e duras, como os previstos pela nova portaria.

“A cessação do refúgio tem a clara finalidade de posterior devolução [dos militantes] ao Paraguai. Por isso, não me surpreenderia se fosse aplicado o rito sumário estabelecido pela Portaria 666, em vez do processamento da extradição, cujo trâmite é no STF e atende aos preceitos do devido processo legal e ampla defesa”, diz a advogada Caroline Godoi.

fonte: https://theintercept.com/2019/08/19/paraguaios-moro-bolsonaro/

 


 

As ambiguidades e limites do fundamento humanitário do refúgio

The ambiguities and limits of the refuge’s humanitarian foundation.

 Fabrício Toledo de Souza 
Pontifícia Universidade Católica do Rio de JaneiroBrazil

As ambiguidades e limites do fundamento humanitário do refúgio

Revista Direito e Práxis, vol. 11, núm. 4, pp. 2212-2237, 2020

Universidade do Estado do Rio de Janeiro

 

Recepção: 12 Agosto 2019

Aprovação: 07 Fevereiro 2020

 

Resumo :A governabilidade humanitária condiciona a proteção do refúgio à imagem da vítima inocente. As práticas governamentais de determinação da condição de refugiado, ao definir quem é o refugiado “verdadeiro”, invariavelmente jogam luz sobre aquele que é construído como o “outro” do refugiado.

Palavras-chave:Humanitarismo, Refugiados, Migrantes, Vítimas.

Abstract:Humanitarian governance conditions the protection of refuge to the image of the innocent victim. Government practices in determining refugee status, by defining who the “true” refugee is, invariably shed light on one who is constructed as the refugee’s “other”.

Keywords:Humanitarianism, Refugees, Migrants, Innocents, Criminalization.

Introdução

O critério legal que define, a partir dos fatos, quem é refugiado faz-se acompanhar, em seu desdobramento prático, por um corte moral que pretende definir quem não é refugiado e cuja extensão e alcance não são previstos em lei. O corte opera a separação entre a verdadeira ou genuína vítima, sempre inocente, de um lado, e o solicitante de “má-fé”, o mentiroso, ou, enfim, o migrante, de outro. Maculado pela ousadia de transpor as barreiras que lhe foram impostas, sejam físicas, militares, legais, morais ou burocráticas, o migrante torna-se o “outro” do refugiado e o “outro” da vítima. Este excesso tornou-se motivos de indagações em diversos países que lidam com os fluxos mistos (refugiados e migrantes chegando nos mesmos fluxos) e que utilizam o sistema de elegibilidade baseado nas definições dadas pela Convenção de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados.

A relevância desta inoportuna e perniciosa ingerência moral sobre o critério legal não se situa apenas nos resultados invariavelmente arbitrários e na criação de categorias humanas hierarquizadas, mas também no incremento do próprio dispositivo e de sua capacidade de definir os critérios de verdade. É por dentro do caráter humanitário do refúgio que tal operação se concretiza e se aprimora e por isso a denúncia de seus efeitos não se faz por suas distorções ou porque o dispositivo falha. Trata-se de uma operação que pesquisa, interpela e produz conhecimento. E que pretende a produção da verdade acerca destas categorias.

O recente episódio em que três refugiados paraguaios, vítimas de sequestro, desparecimento forçado e tortura praticados por agentes do Estado paraguaio, tiveram a proteção revogada pelo governo brasileiro, assim como as recentes propostas para alterar a legislação migratória e de refúgio, ilustram que a generosidade humanitária do Estado brasileiro pode ser facilmente limitada pela retórica do risco à segurança, este outro lado (igualmente moral) da sensibilidade humanitária: a necessidade de proteger a vida em abstrato e a população como uma generalidade.

Neste mesmo sentido, a leitura atenta dos dados sobre os pedidos de refúgio no Brasil – feitos pelos homens e mulheres das partes mais pobres do mundo, contra os quais é imposta a violência mais brutal desde a última guerra mundial – demonstra que a governabilidade humanitária pretende, ao final, inscrever no corpo e mente dos refugiados e migrantes que a proteção à sua vida lhes é outorgada como uma provisória e frágil concessão, condicionada à sua qualidade de vítima inocente. E que o direito sobre sua humanidade, afinal, pertence ao soberano.

O esforço deste texto é demonstrar, a partir da análise destes episódios e casos, os limites e ambiguidades do fundamento humanitário do refúgio. Seguindo autores que se debruçaram especialmente sobre o humanitarismo voltado aos refugiados, como Miriam Ticktin e Didier Fassin, e os trabalhos de Michel Foucault sobre os dispositivos de poder e regimes de governabilidade, pretendemos investigar como opera a racionalidade humanitária do refúgio e alguns dos seus efeitos.

A construção dos argumentos para a cessação do refúgio.

Em 14 de junho de 2019, o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE1) decidiu revogar o status de refúgio anteriormente reconhecido a três cidadãos paraguaios, ex-integrantes de um determinado movimento político de esquerda2. Os membros que participaram da sessão plenária realizada decidiram que não mais persistem no Paraguai as condições que determinaram o reconhecimento dos três ex-ativistas como refugiados3. Deste modo, por força dos votos da maioria (cinco votos a favor da cessação do status e uma abstenção), Juan Francisco Arrom Suhrurt, Anuncio Martí Méndez e Victor Antonio Colmán Ortegra, perderam o status de refugiado que lhes havia sido reconhecido em 01 de dezembro de 2003.

O Presidente do Paraguai anunciou publicamente sua satisfação com o resultado, que abre a porta4 para a eventual extradição dos ex-refugiados5. A decisão, bem como as circunstâncias em torno dela e suas motivações foram objeto de polêmica, com repercussão pouco usual em se tratando de refugiados e processos de refúgio. Os principais jornais repercutiram a notícia, aguardada sem surpresa e com grande insatisfação por ativistas e organizações de direitos humanos que acompanhavam o caso.

A cessação do refúgio permite que o Estado Paraguaio consiga êxito em seu antigo objetivo de obter a extradição dos três ex-ativistas, acusados de terem cometido um crime de sequestro em 2001, supostamente por motivos políticos. Sob a proteção do estatuto, a extradição não seria possível, em virtude de comando legal6. Houve duas tentativas anteriores de obter a revogação da proteção e a sua consequente extradição, em 2004 e em 2010.

De uma certa perspectiva, este episódio pode ser interpretado como uma ingerência indevida do Presidente em um órgão habituado a seguir critérios próprios de atuação e, portanto, expressaria uma mudança na política do órgão7. Pela primeira vez desde que foi criado, o CONARE atendeu a um pedido de revisão feito diretamente por um governo estrangeiro, encaminhado pelo Ministério das Relações Exteriores. A solução para o pedido, que acabou culminando na cessação do refúgio, foi elaborada ao longo de alguns meses e não surpreendeu os atores que se esforçavam por evitá-la. Depois de se convencerem da inviabilidade de propor a simples perda do status, cujos motivos são taxativos (elencados na Lei 9.474/97), os portadores do pedido adotaram a cessação como o caminho para retirar deles o status protetivo.

De outra perspectiva, no entanto, os critérios utilizados para análise e julgamento dos pedidos de refúgio nunca estiveram livres da ingerência política. E embora neste caso a ingerência possa eventualmente estar bem clara e atuar de acordo com um critério ideológico bem definido, sempre houve uma escolha política na condução deste tema. Ainda que o tema migratório e de refúgio tenha entrado nos debates e no radar dos principais candidatos a cargos políticos, é apenas ocasionalmente que isto ocorre8. Já há um bom tempo desde que o tema conquistou uma agenda própria e chamou atenção suficiente dos governos, que passaram a indicar gestores com mais poder e agilidade. Desde então, na mesma medida em que aumentam os números de solicitantes de refúgio e migrantes, aumentam os atores envolvidos e aumentam as ações por parte do governo9.

Seguindo esta avaliação, se é possível aplicar critérios de fundo ideológico – esquerda ou direita – é porque se estabeleceu, antes, um limite moral que separa a verdadeira ou genuína vítima, sempre inocente e imaculada, daquele que é manchado por um crime, por uma suspeita ou pelo risco que apresenta. A questão não é a distinção motivada ideologicamente ou a distinção fundada em termos de segurança – e, portanto, na preservação da vida da maioria da população – mas a distinção fundada em critérios morais. A linha de distinção funciona não apenas para separar, classificar e hierarquizar, mas também para justificar e fazer funcionar o próprio dispositivo de distinção. Um dispositivo de produção de conhecimento e de produção de verdade.

O parecer da Comissão e a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

O pedido de cessação do refúgio reconhecido aos três cidadãos paraguaios foi construído ao longo de alguns meses e foi finalmente anunciado na pauta da sessão de maio de 2019. No entanto, em atendimento à requisição apresentada, a análise da cessação foi suspensa e adiada para a sessão seguinte, depois que Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) tornasse pública sua decisão sobre a responsabilidade do Estado paraguaio a respeito de violência cometida contra dois de seus nacionais. Para os que defendiam a manutenção do refúgio, havia esperança de que a Corte condenasse o Estado paraguaio, acolhendo, assim, a conclusão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Em setembro de 2017, a Comissão havia emitido um relatório atribuindo ao Estado paraguaio a responsabilidade pelo sequestro, desaparecimento forçado e tortura de Juan Francisco Arrom Suhrurt e Anuncio Martí Méndez10.

Contudo, a sentença da Corte, publicada em 13 de maio de 2019, considerou que não havia provas suficientes para responsabilizar o Estado paraguaio. Segundo a decisão, a maior parte das evidências apresentadas para provar a participação do Estado se deu por meio de declarações das próprias vítimas ou de testemunhas indiretas. E considerou ainda que o Estado não foi negligente nas investigações realizadas para apurar os crimes cometidos contra eles. E, finalmente, que as provas não demonstraram que os agentes estatais denunciados pelas vítimas são os verdadeiros responsáveis. A sentença foi objeto de críticas porque supostamente contraria sua própria jurisprudência e a sua tradição em relação à análise e valoração das provas11.

Juan Francisco Arrom Suhrurt e Anuncio Martí Méndez foram sequestrados em 17/1/2002 e mantidos desaparecidos e sob tortura durante 14 dias. Victor Antonio Colmán Ortega foi sequestrado em 19/1/2002, tendo sido apresentado às forças policiais algumas horas depois, durante as quais foi submetido à tortura. Segundo declararam Arrom e Martí, as pessoas que os sequestraram e torturaram eram agentes policiais e queriam que ambos se declarassem culpados pelo sequestro de Maria Edith Debernardi, esposa de um dos empresários mais ricos do país. E queriam que eles declarassem sua intenção em desestabilizar o governo.

Arrom e Martí foram resgatados do cativeiro (propriedade de um agente policial) por familiares e ativistas de direitos humanos, com transmissão ao vivo pela mídia. Por sua gravidade, o episódio motivou um processo de impeachment contra Oscar Latorre, então fiscal (procurador) geral do Estado, e outro contra González Macchi, então Presidente da República, por graves violações aos direitos humanos. A despeito da gravidade do episódio, o governo paraguaio seguiu adiante com as acusações criminais contra eles. No processo de refúgio, reconheceu-se desrespeito aos seus direitos e a falta de imparcialidade do Judiciário12.

A Comissão havia concluído que “o Estado do Paraguai era responsável pela violação dos direitos humanos protegidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas e a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura”. E tal afirmação estava fundamentada na conclusão de que havia “múltiplos elementos que apontam para a participação direta de agentes do Estado, elementos que não foram diligentemente investigados”. E, ainda, que havia sido “violada a presunção da inocência das vítimas” em uma propaganda oficial do governo que apresentou aos mesmos como criminosos13.

Quanto ao processo que determinou a cessação do status de refugiado dos três paraguaios, ocorrido em junho de 2019, o parecer elaborado pelos funcionários do CONARE14 argumenta, com base na Lei de Refúgio15 e na Convenção de 195116, que eles não podem mais recusar a proteção do país de qual são nacionais, uma vez que inexistem atualmente as circunstâncias que determinaram o seu reconhecimento como refugiados. O parecer considera que não subsiste o risco de fundado temor que motivou o refúgio e que o Estado paraguaio e seu Judiciário são capazes de assegurar um julgamento justo aos acusados.

A decisão da Corte enfraqueceu os argumentos pela manutenção do refúgio, a despeito de elementos consistentes que apontavam a persistência de risco de perseguição contra eles e a despeito das marcas profundas e prolongadas que a violência (sequestro, desparecimento forçado e tortura) deixou para os antigos refugiados.

De acordo com as orientações do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), acerca da adequada interpretação da Convenção de 1951, a manutenção do status é justificável quando permanecem os motivos do fundado temor de perseguição e/ou porque os fatos foram graves o suficiente para que eles não queiram ou não possam se valer da proteção de seu país17. De acordo com as orientações do ACNUR, para a cessação, é necessário que as mudanças fundamentais no país tenham a capacidade de eliminar o fundado temor de perseguição. Nos termos do item 135 do Manual:

A mera mudança – possivelmente transitória – dos fatos que fundamentam o temor do refugiado, e que não constitui uma mudança significativa das circunstâncias, não é suficiente para a aplicação dessa cláusula. A condição de refugiado não deve, em princípio, sujeitar-se a revisões frequentes em detrimento da sensação de segurança que a proteção internacional pretende oferecer18.

Quando o impacto provocado pela violência cometida contra a pessoa demandante de proteção é substancialmente grave, é recomendável que se mantenha a proteção. Quanto às pessoas que sofreram perseguições muito graves no passado, recomenda o ACNUR que elas não devem perder o status, mesmo no caso de mudanças fundamentais em seu país de origem. Esta exceção às hipóteses de cessação, prevista no item 5, C, do artigo 1º da referida Convenção, e comentada no Manual, no item 136, reflete um princípio humanitário mais geral, a partir da conclusão de que não é possível ou conveniente a repatriação de pessoas que sofreram formas atrozes de perseguição.

Nos termos das orientações do Manual, “ainda que possa ter havido uma mudança de regime no país, esse fato nem sempre produz uma alteração completa na atitude da população, nem na mente do refugiado, tendo em conta as suas experiências passadas”19. Seria possível interpretar que o desaparecimento forçado e as torturas impostas a eles correspondem à definição de forma “atroz” de perseguição.

O tema migratório na agenda política e as sensibilidades em disputa.

Historicamente, a cláusula de cessação é aplicada com extrema reserva, depois de consultas formal ao ACNUR a respeito do contexto local para fins de repatriação. Ela foi aplicada uma única vez, em junho de 2012, para fazer cessar o status dos refugiados angolanos e liberianos que chegaram ao Brasil nos anos 1990, no contexto das guerras civis deflagradas naqueles países. E, mesmo assim, a cessação coletiva foi antecedida por uma grande campanha de divulgação, facultando aos refugiados liberianos e angolanos a obtenção de status migratório permanente no Brasil ou a repatriação voluntária, financiada pelo ACNUR20.

O episódio também ganhou repercussão por causa das manifestações do Presidente da República e de seu Ministro da Justiça. Em sua conta numa rede social, o Ministro expôs sua posição de não permitir que criminosos sejam considerados refugiados21. O Presidente da República, por sua vez, se manifestou antes mesmo da decisão, na presença do representante do Paraguai, dizendo que o Brasil não acolheria “terroristas” e “bandidos”22. Ambos fazem expressar uma preocupação com questões de segurança e criminalidade, mas também abrem margem para questionamentos a respeito da motivação ideológica da própria cessação23.

A propósito disso, o governo articulou ações para alterar a recentemente aprovada Lei de Migração (Lei 13.445.17) e a Lei de Refúgio (Lei 9.474/97), especialmente no sentido de restringir a admissibilidade de migrantes e refugiados, de facilitar a deportação ou repatriação sumária e de permitir a detenção administrativa de migrantes para fins de devolução. A primeira importante iniciativa neste sentido se deu pelas propostas incluídas no Projeto de Lei 1928, através de uma emenda apresentada por um senador ligado à base governista24. Como ele mesmo declarou em sessão no Senado, as suas emendas atendem a um pedido e orientação do Ministério da Justiça, especificamente dos gestores responsáveis pelo tema25.

Enquanto aguarda os trâmites das propostas no Legislativo, o governo emitiu uma recente decisão, através de portaria normativa assinada pelo Ministro da Justiça, com semelhante conteúdo, adicionando novas hipóteses e novos critérios para a inadmissão da entrada de pessoas que apresentem algum risco à segurança26.

Nos últimos anos, o assunto passou a interessar cada vez mais os gestores e parlamentares. De um lado, existem objetivos concretos e práticos em restringir e controlar os fluxos, justificadas por cuidados com segurança e soberania, sempre a partir de riscos superestimados. E, de outro, a retórica sobre soberania, segurança e fechamento de fronteiras é assimilada pelos atores políticos como um possível capital na garantia de apoio e de votos, dentro de um contexto global em que esta retórica consegue atrair consenso majoritário. Não é novidade na história da atuação do legislativo brasileiro que o tema migratório seja tratado de maneira restritiva. Ao contrário, com poucas exceções, grande parte das medidas legislativas e normativas foram fundamentadas em conceitos absolutamente antagônicos aos direitos das pessoas deslocadas. E nem sempre por questões de segurança, mas também com objetivos de “branqueamento” da população27.

A partir de uma avaliação que considera um campo mais amplo, elementos heterogêneos, o histórico da atuação legislativa e as tendências que ainda se insinuam, seria possível afirmar que há consideráveis riscos de que sejam realizadas mudanças legislativas e reorientações das estruturas, com consequências negativas para as pessoas migrantes e refugiadas. A preocupação com riscos para segurança, portada principalmente por gestores atuando no Ministério da Justiça e provenientes de carreiras da Polícia Federal, tende a ganhar expressão real e concreta na legislação e nas práticas institucionais, dando às autoridades policiais maior poder discricionário no controle de entradas de pessoas e nos processos de admissão. Grande parte das propostas apresentadas pelos representantes das forças de segurança e que foram recusadas nas disputas durante a criação e promulgação da nova Lei de Migração, estão sendo atualizadas em projetos de alteração de lei, decretos, portarias e resoluções.

Se o futuro insinuado para os para os migrantes e refugiados é incerto, convém lembrar que o presente está longe de ser satisfatório, a despeito de grandes conquistas. Contando hoje com uma lei de refúgio considerada generosa, que inclui a definição ampliada de refugiado, uma estrutura institucional mais pluralista28, e também uma nova Lei de Migração, com um importante elenco de garantias para migrantes29, as práticas institucionais e o regime de governabilidade mantiveram e até aprofundaram grandes déficits de direitos. Os baixos índices históricos de análise e solicitações de refúgio, reduzidos casos de deferimento de refúgio e de residência30, a prática restritiva de concessão de vistos (para pessoas originárias de países pobres)31, dentre outros elementos, demonstram a estabilidade e manutenção de enormes lacunas em termos de direitos e proteção.

Dois lados da moeda: O refugiado “inocente” e o migrante “perigoso”.

O conjunto de eventos que resultou na cessação do refúgio para Arrom, Martí e Ortega e o resultado obtido é, em certa medida, expressivo das linhas tendenciais em movimento atualmente. Podemos assumir que o episódio serviu como um teste para mensurar a sensibilidade e a reação da opinião pública, a partir da relação entre aumento de migrantes e aumento de crimes. Uma relação que se constrói com alguns ingredientes conhecidos: primeiro, suscitando a imagem – que pode corresponder com maior ou menor fidelidade à verdade – de que inexistem quaisquer tipos de controle nas fronteiras e pontos de entrada. Junto a isso, se explora a sensação de impunidade generalizada – que tem bases materiais e concretas -, a partir da qual se conclui que uma “terra sem lei” é o lugar próprio para acolher os criminosos. Deste modo, a indignação bem justificada, acumulada por longas e profundas experiências de iniquidade e violência, dão atualidade e consistência para uma hostilidade volátil contra o migrante, uma das figuras, dentre muitas, do inimigo que nos espreita.

Em um contexto de grande volume de venezuelanos chegando ao país via fronteira norte32, exatamente em uma região com história de parcos investimentos e muitas desigualdades, com impactos evidentes para capacidade de ação dos gestores e para os relatórios estatísticos (há cinco anos o Brasil tem sucessivos recordes no aumento de solicitações de refúgio, num crescimento exponencial), os elementos para uma “crise” estão bem colocados. E, evidente, toda crise, enquanto exceção, merece uma resposta a altura, ainda que a crise seja o regime natural das coisas e que a exceção seja o modo normal de governabilidade. Está crise, no entanto, é não apenas antiga, mas é mesmo fundante.

A crise se situa mesmo no âmbito mais essencial do regime de governo dos deslocados e refugiados: está situada no âmago do princípio humanitário que funda e justifica o refúgio. Este episódio demonstra justamente o ponto limite do humanitário. No momento em que se considera que a vítima não possui ou deixou de possuir sua inocência – o que implica dizer, em última análise, que não é uma vítima – o estatuto humanitário do refúgio deixa de ser aplicável. E este julgamento sobre a qualidade de vítima inocente está sujeita não a critérios objetivos e à vinculação legal, mas a avaliações de natureza moral. E, portanto, sujeito a escolhas arbitrárias, a diferentes interpretações e sensibilidades.

É preciso considerar as eventuais ingerências políticas, partidárias e ideológicas não apenas nos casos extremos. Não apenas nas linhas de ruptura e nos movimentos bruscos e exacerbados. É preciso verificar como estão se fortalecendo, dentro e a partir das dinâmicas ordinárias, dentro dos fundamentos da política migratória, os elementos que acentuam as arbitrariedades. E, neste sentido, é por dentro do revigoramento constante da clivagem que contrapõe, de um lado, a vítima inocente e, de outro, o suspeito, que se estabelecem os critérios para restrição e controle dos fluxos de pessoas e o seu acesso a direitos. E isso se faz acontecer inclusive e principalmente a partir do elemento “humanitário” que constitui o principal argumento de defesa que se utiliza em favor dos deslocados forçados.

A demonstração mais consistente do caráter humanitário do refúgio, na sua expressão concreta realizada pelo Estado brasileiro, a partir do CONARE, não se daria pela avaliação apenas dos casos extraordinários e incomuns. Seria mesmo a partir do grosso dos casos, das práticas mais usuais, cotidianas e banais que se pode defrontar com esta forma de julgamento moral. E é a partir deste ponto que se poderia iniciar uma reflexão mais atenciosa sobre o sentido profundo do que significa a dimensão “humanitária” do refúgio, as suas bases jurídicas, filosóficas, éticas e políticas, e, em especial, os efeitos que derivam de seu uso.

Ao se analisar os dados oficiais fornecidos pelo CONARE, é possível verificar que a maioria das pessoas reconhecidas como refugiadas tem como origem a Síria, a República Democrática do Congo, Colômbia e Palestina. Estes são os quatro principais grupos de refugiados reconhecidos no Brasil, dentro de um universo de pouco mais de dez mil refugiados. Ao se verificar os dados sobre solicitantes de refúgio, os principais grupos são originários de Venezuela, Haiti, Senegal, Síria e Angola. Há ainda um número significativo de solicitantes de Cuba, República Democrática do Congo, Bangladesh e Nigéria, parte de um universo muito mais amplo do que o de refugiados, composto por cerca de 126 mil pessoas solicitantes de refúgio33.

Dentre estes grupos de solicitantes, se mantiver sua tendência, a plenária do CONARE deverá recusar os pedidos de refúgio feitos pelos haitianos e senegaleses, bem como deve indeferir a maior parte das solicitações feitas pelos angolanos, bengalis e nigerianos. Em geral, a plenária do CONARE tem interpretado que deslocamento destes solicitantes tem motivação migratória e, portanto, razões diversas daquelas consideradas como fundamento para o refúgio34.

De outra parte, quanto aos venezuelanos, nos termos do que decidiu a Plenária do CONARE, em sessão de 24 de julho de 201935, foram reconhecidos refugiados, com base a definição ampliada, que trata da situação de grave e generalizada violação de direitos humanos36. No entanto, mantendo-se a tendência atual, é possível que a maior parte deles busque uma solução mais rápida e simples, através da obtenção de residência.

O cenário, portanto, apresenta uma certa homogeneidade, na medida em que a maioria absoluta das pessoas reconhecidas refugiadas e a maioria dos potenciais refugiados (dentre os solicitantes) é composta por pessoas vítimas de violação a direitos básicos e, assim, vítimas humanitárias, cuja filiação política ou ideológica e mesmo cujo perfil são pouco relevantes. Grande parte destas pessoas deixaram países em conflito, como é o caso dos sírios, venezuelanos e congoleses. Uma outra parte tem como principal razão para o deferimento da proteção questões ligadas à filiação ou prática religiosa ou pertencimento a um determinado grupo social (pessoas perseguidas por sua origem étnica, sua orientação sexual ou atividade profissional, dentre outros motivos).

E alguns poucos foram ou serão reconhecidos refugiados em razão de sua atividade política, em sentido amplo, incluindo membros de partidos de oposição e seus familiares, integrantes de movimentos reivindicatórios (opositores em sentido amplo) ou pessoas a quem os perseguidores – o governo e ou as forças de repressão sob seu comando – atribuem a qualidade de opositores, em razão de suas atividades (defensores de direitos humanos, líderes comunitários e sindicais, estudantes, etc).

Dentre os congoleses reconhecidos refugiados, por exemplo, há um número significativo de jovens que foram perseguidos apenas por participarem de manifestações e protestos contra o regime então vigente. Alguns cubanos receberam proteção porque abandonaram cargos públicos ou missões e transformaram-se automaticamente em traidores por seu governo. E há ainda, dentre os colombianos, camponeses perseguidos por paramilitares porque prestaram algum serviço (muitas vezes sob violenta coação) a grupos armados de esquerda37. Dos venezuelanos que deixaram o país e solicitaram refúgio, há pessoas que foram consideradas opositoras apenas por se manifestarem insatisfeitas frente a um regime responsável por uma das maiores crises sociais do mundo atual.

O que há em comum entre todos eles, refugiados e potenciais refugiados, é justamente o fato de serem considerados vítimas e, portanto, pessoas carentes de uma proteção humanitária. O conceito ou sentido de vítima, no entanto, quando se trata de refugiados, invariavelmente está associado à ideia de inocência. Assim, a vítima, para que seja considerada uma “verdadeira” vítima, digna da atenção humanitária, deve ser a vítima inocente. E a inocência, neste caso, não apenas em termos jurídicos ou criminais, mas sobretudo em termos morais. E por isso, o sentido da inocência é sempre difusa e volátil, ao sabor das tendências morais do momento ou de cada subjetividade.

Isso é o princípio a partir do qual se poderá construir dinâmicas binárias de oposição que fazem funcionar diferentes modos de inclusão, o que significa, diferentes hierarquias e diferentes modos de acessar direitos. Nesta dinâmica, a vítima inocente, como régua moral, definirá o refugiado como merecedor de proteção e a partir do refugiado eleito como vítima inocente serão atualizadas as demais classificações. Haverá os refugiados, como vítimas verdadeiras e os solicitantes “falsos”, ou seja, aqueles aos quais se recusou o status, eventualmente porque “mentiram” ou porque “abusaram” da via do refúgio.

Usualmente, aliás, se separam os solicitantes de refúgio entre os que estão munidos de “boa fé” e os que agem por “má fé”, o que significa um julgamento com critério moral que funciona apenas a posteriori (a resposta negativa justifica e confirma que ele agiu de má fé e, portanto, seu próprio fracasso na empreitada), mesmo que sirva a priori (para justificar os critérios morais de avaliação)38. É neste sentido, a propósito, que o instituto de refúgio, ou melhor, a possibilidade de conquistar um mínimo de proteção e cidadania – porque é isso afinal que importa – é sempre algo apresentado e defendido como um bem escasso e raro, que não pode ser distribuído indiscriminadamente e a todos.

E haverá ainda os migrantes, aos quais, com exceção daqueles considerados migrantes “humanitários” (um conceito cuja interpretação pode variar em cada momento ou situação), serão destinadas a desconfiança e hostilidade por terem burlado as barreiras – no caso dos chamados de “ilegais” – ou por terem acesso a um privilégio raro (atravessar uma fronteira que não deviam ter cruzado, obter documentos, etc). E, neste caso, a cidadania formal que um documento concede aos migrantes é assumido também como um luxo raro. Enfim, há uma intensa produção de classificações, binarismos e hierarquias, por meio de diversos dispositivos. E, neste funcionamento, a categoria da vítima inocente deve funcionar para excluir as outras, a partir de critérios e julgamentos morais.

Nesta dinâmica, a inocência pode se afirmar apenas pela produção de uma verdade, que será declarada, confessada e ou admitida pelos refugiados e colocada em exame pelos julgadores. E, assim, a desconfiança sempre é um recurso a disposição, em qualquer momento, mesmo para os que foram reconhecidos refugiados e mesmo para aqueles que são refugiados há muitos anos. Em todos os seus atos, relacionados a documentos ou mobilidade, será possível observar, avaliar e julgar a verdade de sua inocência, de sua qualidade de vítima e de sua honestidade. Se um refugiado precisa de um passaporte, ele deve provar que viajará. Se ele precisa viajar com seu passaporte, precisa de autorização. Se em algum momento se descobre que mentiu em seu pedido de refúgio – e a mentira pode sobre um fato secundário ou circunstancial – será passível de perder o status. E se mudam os ventos e se um governo os julga criminosos ou terroristas, poderão ter o refúgio cessado.

Sensibilidades, percepções e juízos morais: relação entre risco, crime e migração.

A este respeito é interessante verificar a redação da recente normativa que define hipóteses de inadmissão para o refugiado considerado “perigoso” para a segurança do país39. Um de seus efeitos é dar à autoridade policial a prerrogativa de definir quem entra e quem não entra, através de critérios que são mais restritivos que a Lei de Refúgio e do que a própria Convenção de 1951. E ela define como impedido de pedir refúgio não apenas os formalmente condenados, mas também os suspeitos, o que significa, inclusive, os que respondem investigação criminal. E sem distinguir se esta investigação é uma modalidade de perseguição injusta, que busca um subterfúgio para obter aparente legitimidade, como não raro acontece.

Apenas como ilustração, vale referir a um dos episódios mais recentes de perseguição dissimulada em forma de procedimento judicial, envolvendo uma comunidade de turcos vinculados ao movimento “Hizmet” ou “Güllen”. Membros deste movimento estão sendo amplamente perseguidos em várias partes do mundo, incluindo Estados Unidos da América, Canadá, Europa e Brasil, além da própria Turquia. Um dos mecanismos utilizados para a perseguição é o uso da extradição, que, no Brasil, implicou a prisão de um destacado membro daquela comunidade, posteriormente liberado. Os pedidos de refúgio apresentados pelos turcos perseguidos no Brasil não foram julgados até o momento, nem tampouco o pedido de extradição processado no Supremo Tribunal Federal, mas os solicitantes são portadores dos elementos para serem reconhecidos refugiados40. Na maior parte dos pedidos de extradição, em outras partes do mundo, as respostas foram negativas.

O risco da aplicação imediata por parte de um agente policial na fronteira ou em um ponto de entrada, sem avaliação criteriosa sobre o fundamento dos fatos, poderia impedir que estas pessoas ou outras em mesma situação tivessem acesso ao processo de refúgio. Neste sentido, uma avaliação mais atenciosa por parte dos membros do CONARE, em um processo devidamente instruído, com contraditório e ampla defesa, apoiado com informações oferecidas pelo ACNUR, pelo Ministério das Relações Exteriores e ou pelo representante da Sociedade Civil, dentre outros, permite um melhor julgamento sobre a possibilidade e conveniência do deferimento do refúgio. E sem excluir os procedimentos de controle e segurança que as autoridades podem adotar antes e durante o processamento do pedido de refúgio. As preocupações com segurança e proteção não são excludentes.

Ambiguidades do regime humanitário: classificação, hierarquização e sujeição.

As práticas e discursos humanitários que fundamentam as políticas públicas voltadas às pessoas deslocadas, por mais que seja bem-intencionadas, podem ter efeitos perniciosos para elas, especialmente se substituem a perspectiva de direitos e justiça por uma abordagem fundada na compaixão. Acompanhamos Miriam Ticktin (2015) quanto a isso e também quando ela acusa o problema da inocência: o refugiado é compreendido como uma vítima inocente para quem são destinadas ações de emergência, que desconsideram o contexto e história dos fenômenos que determinaram o deslocamento.

El humanitarismo sólo se ocupa del presente: tenemos ‘crisis’ humanitarias o ‘emergencias’ que requieren acción inmediata. Con esta perspectiva temporal no hay forma de entender los fenómenos en su contexto histórico más amplio. No hay tiempo de pensar en el pasado ni de planificar el futuro. El humanitarismo crea fenómenos aparentemente repentinos e impredecibles. La guerra contras las drogas – y las insaciables peticiones desde los Estados Unidos – la creciente desigualdad entre ricos y pobres que está provocando esta violencia, y cambiar ambas, sólo puede hacerse con nuevas estrategias. De forma similar, el ‘hambre’ que lleva a los migrantes desde África a Europa está configurado por las historias de programas de ajuste estructural entreveradas con las historias coloniales. Y tanto las muertes en la frontera México-Americana como en el Mediterráneo están configuradas por la enormemente lucrativa industria de la migración – un ejemplo excelente del funcionamiento del capitalismo global -, y por los beneficios de las empresas transnacionales inversoras en tecnologías de vigilancia, detención y prisión. En el mejor de los casos es ingenuo sugerir que el cruce de fronteras vaya a ser detenido por las vallas, o los ahogamientos por los actores humanitários (TICKTIN, 2015, p. 295).

E se o Estado opera sobre esta lógica, é preciso ver que a retórica das organizações humanitárias e das campanhas de sensibilização estão baseadas nesta mesma distinção: somente a imagem da vitimização e da inocência permitem a existência do refugiado. É preciso, como condição para atravessar as fronteiras, na forma de muros e da burocracia, não ser culpado pela própria fuga. Esta distinção – que se faz sempre em termos muito ambivalentes e sempre em disputa – tende a suprimir as nuances entre os sujeitos, entre os motivos das fugas, e também a neutralizar a contextualização mais complexa sobre os conflitos e a violência, fragmentando as narrativas de modo a selecionar apenas as confissões de dor e impotência.

Didier Fassin, um dos autores de referência dentre aqueles que refletem criticamente sobre o tema do humanitarismo, formula sua crítica neste mesmo sentido e diz que a mobilização coletiva da compaixão, como elemento central da política e da governabilidade, procura tomar o lugar dos tradicionais conflitos políticos (FASSIN, 2012). E tem como efeito suprimir a memória da exploração e da desigualdade que estão por trás dos conflitos. Por meio de fundamentos e de razões humanitárias, os Estados implementam políticas que agravam as desigualdades sociais e violam os direitos das minorias, incluindo os migrantes e refugiados. Fassin, a propósito da gestão humanitária, inclui não apenas as ações e práticas das agências do estado, mas igualmente aquelas das levadas a cabo pelos órgãos internacionais e organizações não-governamentais, e, deste modo, ele trata de criticar a governabilidade humanitária. Não se trata, evidentemente, de minimizar a importância do trabalho humanitário, mas perceber os perigos imanentes e as ambivalências, sem maniqueísmos, demonizações, romantizações e idealismos.

Costa Douzinas, autor que também se debruçou sobre o problema do humanitarismo, acusa na retórica dos direitos humanos o seu caráter “antipolítico”(DOUZINAS, 2015) e, como Fassin, denuncia o processo de enfraquecimento da política e a transformação da política, do governo e do mundo sobre o qual se ergueu ou deveria se erguer o “sujeito de direitos”(FASSIN, 2012). A ascensão do “humanitarismo” como elemento de governabilidade ocorre no decorrer do momento histórico e político em que a vida humana e a sobrevivência da população se tornam o ponto central da governabilidade. Neste sentido, o sujeito de direitos imaginado e desejado pelas revoluções modernas cede lugar ao humano como vivente, como mera vida biológica.

O regime da governabilidade biopolítica, tão bem descrito por Michel Foucault em alguns de seus principais trabalhos, justifica a desigualdade e mesmo a violência na necessidade de garantir a segurança e sobrevivência da população, sendo a vida biológica o fundamento do próprio governo (FOUCAULT, 2008a e 2008b). É sobre um direito à vida, abstrato e genérico, que se assenta a governabilidade ou regime “humanitário”, e que, portanto, toma a vida supostamente biológica – a “vida nua” de que trata Giorgio Agamben – como pilar de ação do governo (AGAMBEN, 2002). Por este motivo, o humanitarismo é criticado como o soterramento das lutas e dos desejos por mudanças, realizada através da ascensão da vítima como a figura paradigmática e também como uma virtualidade generalizável: todos e qualquer um pode ser uma vítima. O sofrimento e a compaixão acendem ao centro do palco da política, juntamente com a vítima. Simultaneamente, o direito à vida é definido e suposto como um bem transcendente, concedido por um ente divino, que pode ter o nome de Deus, mas também ser o Príncipe ou o Estado. Enfim, o poder de exceção, que decide o que está dentro e o que está fora da lei.

Frente à vítima inocente, impotente e passiva, sua contrapartida é o sujeito perigoso, o desviante, o anormal. Enfim, o risco, corporificado arbitrariamente naquele que os ventos políticos elegem como tal. Inclusive o migrante, sendo que este nome pode se referir à pessoa que foge da violência em busca de paz, mas também pode se referir ao “outro” do refugiado, ou seja, aquele solicitante que fracassou, que mentiu ou burlou as regras. Desta forma, como diz Ticktin (2015), a ênfase na inocência e vitimização invoca um espaço em que simultaneamente convivem a compaixão, a vigilância, a repressão e culpa.

Não apenas os traficantes e coiotes são assumidos e divulgados como as figuras criminosas, mas os migrantes e refugiados que possam ser associados a eles ou confundidos com eles. E mesmo quando os deslocados, em seu desespero, se veem obrigados a fazer uso destes serviços, acabam por ter sua inocência maculada. É a sua existência virtual, atualizável, que importa, mais do que exatamente a responsabilização individual. A figura da vítima inocente pode perecer antes mesmo que ela receba o reconhecimento, tão logo seja associado a ela algum ato, mesmo secundário ou irrelevante, mesmo desesperado, que possa manchar a sua absoluta inocência. Importante lembrar que o pai de Aylan Kurdi, o garoto sírio encontrado sem vida na praia da Turquia, foi criminalizado por ter “arriscado” a vida do filho ao fugir da guerra41.

É mais difícil provar-se vítima e inocente para um solicitante de refúgio quando ele é acusado por um crime. Neste caso, é mais improvável que ele receba a empatia dos que o julgam e, em alguns casos, dependendo da gravidade do crime, é possível que se aplique a ele alguma das causas de exclusão, conforme determinada em lei42. A razão humanitária aqui encontra seu principal limite. Não é possível proteger alguém cuja vida está em perigo se esta pessoa foi condenada por tráfico de drogas, por exemplo. Este limite, como se vê, pode ser um limite legal, quando, por exemplo, se trata de aplicar uma cláusula de exclusão ou perda. O crime pelo qual foi condenado formalmente é, nestes casos, incompatível com o refúgio. Pode, no entanto, ser justificado moralmente, e, por vezes, em contrariedade ao próprio texto legal e a princípios constitucionais, como o de presunção de inocência. Não é incomum que isso aconteça nos casos analisados e julgados pelo CONARE, mas será raro que exista registro sobre os motivos da recusa.

Conclusão

Os refugiados tornam-se refugiados se afirmam sua condição de vítimas e tão somente se convencem os seus anfitriões de sua peculiar condição. Além da análise do enquadramento legal, estarão sujeitos a um ilimitado e indefinido processo de verificação, que funciona a partir de critérios morais. Desta forma, inocência e honestidade estão associados como valores que justificam o refugiado e justificam a resposta negativa para os não-refugiados. E por isso analisar a credibilidade (muitas vezes feita pela chamada análise de consistência interna e externa) ganha tanta relevância nos processos de refúgio43. Porque trata-se também de verificar os elementos morais, a honestidade e a sinceridade do solicitante de refúgio. E tal verificação seguirá o refugiado por todo o tempo de sua vida como refugiado.

A definição de refugiado depende da possibilidade de distingui-la da definição de migrante e tal distinção tem como critério a liberdade e a vontade: de um lado, a coerção da fuga, no caso dos refugiados e, portanto, a inexistência da vontade e da voluntariedade. E, de outro, os migrantes, que supostamente puderam escolher e decidiram por cruzar as fronteiras, muitas vezes contrariando as leis e obstáculos. No primeiro caso, a coerção pressupondo a inexistência de vontade, qualifica o refugiado como a vítima e por isso se fala em termos de deslocamento forçado. O migrante, no segundo caso, é aquele que desde o início planejou seu deslocamento e por isso é suposto como aquele pleno de vontade. Uma vontade invariavelmente “perigosa”. E se a vida em seu país é difícil e se o deslocamento tem seus imensos desafios, isso tudo apenas reforça ainda mais sua voluntariedade e seu esforço. Se sucede que consiga refúgio, o migrante é um refugiado. Se fracassa, o migrante é visto como culpado e como um risco. Ele se anuncia como um risco – do que pode ser capaz, afinal, alguém que se desloca a despeito de todas as dificuldades? – e anuncia um fluxo que será imaginado eventualmente como uma invasão.

A propósito desta distinção, Ticktin (2015) afirma que em oposição à imagem dos refugiados como vítimas passivas, carentes de salvação – a imagem clássica da inocência – os migrantes são percebidos como embusteiros que tentam se aproveitar dos serviços públicos e dos benefícios do estado. No contexto europeu onde está situada, ela diz, este ponto é ainda mais sensível na medida em que o abuso dos benefícios é percebido não apenas como debilidade da segurança apenas, mas também dos próprios valores europeus. O humanismo, diz ela, não decide o limite de separação entre os que vivem e os que morrem, mas, em especial, determina as hierarquias de humanidade, de modo que alguns são “mais humanos que outros”.

De acordo com este critério humanitário, a cidadania é permitida apenas àqueles que se apresentam e se confessam como vítimas. Apenas o sofrimento e a coerção podem libertá-los da culpa por fugir. E somente a condescendência poderá redimi-los. Não se trata de criticar a existência de instituições promovendo uma proteção absolutamente necessária, nem minimizar a importância da solidariedade e empatia, e, muito menos, negar que sobreviver é tudo que importa. Ao contrário. Por isso, o que parece problemático, frágil e falso é tomar o estatuto de refugiado como uma concessão benevolente destinada aos moralmente inocentes. A questão que merece atenção é a inclusão do humanitário como componente das gestões destas pessoas, especialmente na classificação moral dos sujeitos, na hierarquização por meio de categorias e na distribuição dos direitos e de cidadania.

O episódio envolvendo os ex-refugiados Arrom, Martí e Ortega nos mostra o limite do humanitário e a sua fragilidade essencial, isto é, sua natureza e qualidade moral. E se toda regra legal, assim como toda decisão jurídica possuem componentes morais, o estatuto de refugiado é, por excelência, um estatuto fundado em sentimentos morais. E, portanto, mais vulnerável a decisões de momento. Foi justamente por dentro da racionalidade humanitária que se tornou possível denunciá-los, em atendimento aos acordos políticos daquela ocasião, como falsas vítimas. Minando as sensibilidades humanitárias, foi possível utilizar o expediente de cessação (alegando que não subsistem os motivos que os levaram a busca refúgio). Como se num passe mágico, e ao contrário das evidências, toda violência tivesse desaparecido e como se todas as memórias sobre as torturas encontrassem descanso.

Da mesma forma, quanto aos inúmeros refugiados e potenciais refugiados que buscam proteção no Brasil, fugindo das violências brutais e injustas que castigam os cantos mais pobres do mundo, encontram-se eles enredados nestes dispositivos de governabilidade que querem defini-los, politicamente e subjetivamente, como beneficiários de uma condicionada benção. A sua vida é agora uma dádiva que lhes foi dada por um generoso gesto de soberania – uma dádiva rara, escassa e excepcional. Como consequência, devem manter-se ligados ao soberano como aquilo que confessaram e se comprometeram a ser: vítimas inocentes e impotentes.

Restaria, por fim, pensar se há brechas. Uma reflexão para um outro momento, mas que poderíamos ensaiar deste já, para afastar a ideia de que a impotência é um destino inescapável. Afinal, os refugiados, os migrantes e todos os deslocados – estes sujeitos em fuga que ousaram ter a coragem de sobreviver – encontraram brechas em algum momento e de algum modo puderam anunciar uma humanidade além daquela pretendida pelo regime humanitário, uma sobrevivência além da vida no limite e, inclusive, um direito além daquele concedido precariamente por seus anfitriões. Enquanto deixavam para trás a violência e as guerras e aprendiam as rotas rumo à segurança, por mais frágil e provisória que seja, talvez possam nos ensinar que fugir é um direito, e que o direito é a expressão imanente de seu gesto, de sua força e de sua potência. Irredutível, inapreensível e inalienável.

Referências bibliográficas

ACNUR, Manual de Procedimento para a Determinação da Condição de Refugiado de Acordo com a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 Relativos ao Estatuto dos Refugiados

AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer. O poder soberano e a vida nua. Belo Horizonte: UFMG, 2002.

__________. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, 2003.

CERQUEIRA, Daniel “Estándar de prueba y argumentación jurídica em la era de la posverdad”, 13/06/2019. Blog Justicia em Las Américas. Disponível em https://dplfblog.com/2019/06/13/estandar-de-prueba-y-argumentacion-juridica-en-la-era-de-la-posverdad-comentarios-a-la-sentencia-de-la-corte-interamericana-en-el-caso-arrom-suhurt-y-otros-vs-paraguay.

CHAVARRÍA, Ana B.G. “Debates sobre la prueba en el litício ante la Corte Interamericana”. Anuario Mexicano de Derecho Internacional, vol. XIX, 2019, pp. 293-325).

DOUZINAS, Costas. “As Muitas Faces do Humanitarismo”, Revista Direito & Praxis, vol. 06. N.11, 2015, p. 375-424.

FASSIN, Didier. Humanitarian reason: a moral history of the present. University of California Press, California, 2012.

FOUCAULT, Michel. Segurança, Território, População. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

__________. Nascimento da biopolítica: curso no Collège de France: (1978-1979). São Paulo: Martins Fontes, 2008b.

GETIRANA, Larissa M. “As entrevistas de elegibilidade no processo de refúgio brasileiro”. Dissertação de mestrado. Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (2019).

MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. “Refúgio significa saudades: A Política Brasileira de Reunião Familiar de Refugiados em Perspectiva Comparada (1997-2018)”, tese de doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, na FFLCH/USP (2019).

SPRANDEL, Marcia A. “Leis migratórias e conservadorismo parlamentar no Brasil: o caso da Lei 13.445, de 2017”. In ACNUR/IMDH. Cadernos de Debates: Refúgio, Migrações e Cidadania, v.13. dezembro de 2018.p. 37-60.

___________. “Migração e crime: a Lei 6.815, de 1980”. REMHU, Revista Interdisciplinar de Mobilidade Humana, 2015, v. 23. N.45, p. 145-168.

TICKTIN, Miriam. “Los problemas de las fronteras humanitárias”. In: Revista de Dialectologia Y Tradiciones Populares, vol. LXX, n. 2, pp. 2911- 297, julho/dezembro de 2015.

ZERBINI, Renato (Org). “O Reconhecimento dos Refugiados pelo Brasil. Decisões comentadas do CONARE”. ACNUR, 2007.

WALDELY, Aryadne B. “Narrativas da ‘vida em fuga’: a construção política-jurídica da condição de refugiado no Brasil”. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade Nacional do Rio de Janeiro, (2016).

Notas

1 O Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) é organismo integrante do Ministério da Justiça e Segurança Pública e tem, dentre suas atribuições, a instrução, análise e decisão dos pedidos de refúgio. Foi criado em julho de 1998, por força da Lei 9.474/97.
2 “Ministério revoga refúgio de paraguaios acusados de extorsão”. Agência Brasil, 23/07/2019. Disponível em http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2019-07/ministerio-revoga-refugio-de-paraguaios-acusados-de-extorsao [último acesso em 02/02/2020].
3 O resultado da votação, bem como as razões da decisão e o debate que levaram ao resultado foram registrados pelo próprio autor, durante a sessão. Nem todas as atas das sessões do CONARE estão disponíveis para consulta (https://www.justica.gov.br/seus-direitos/refugio/conare).
4 Cabe ao Supremo Tribunal Federal analisar e decidir sobre a possibilidade ou não de extradição. E ao Presidente da República cabe a última palavra, caso o STF decida pela extradição.
5 “Paraguai comemora revogação de status de refugiados de acusados de sequestro”. UOL Notícias. 14/06/2019. Disponível em https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/efe/2019/06/14/paraguai-comemora-revogacao-de-status-de-refugiados-de-acusados-de-sequestro.htm. [último acesso em 23/07/2019].
6 Nos termos do artigo 33, da Lei 9.474/97, o reconhecimento da condição de refugiado obsta o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram o refúgio.
7 Em encontro com seu homólogo, ocorrido em março de 2019, o Presidente da República declarou: “O Brasil e nosso governo não dará asilo a terroristas ou qualquer outro bandido escondido aqui como preso ou refugiado político”. ˜Brasil avalia cancelar refúgio a paraguaios condenados pela justiça. Agência Brasil EBC. 12/03/2019. Disponível em http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2019-03/brasil-avalia-cancelar-refugio-paraguaios-condenados-pela-justica [Último acesso em 20/07/2019].
8 Exceção pode ser concedida à situação em Roraima, onde o grande fluxo de venezuelanos impactou de maneira relevante a paisagem, as demandas por políticas públicas e a vida da população local.
9 Nos últimos cinco anos, houve mudanças significativas dos conteúdos das principais Resoluções do CONARE, bem como nas práticas do órgão. E um acréscimo substancial de atores envolvidos na gestão do tema, tanto através de participação direta no atendimento ou nos processos de decisão, quanto nas atividades de incidência e de comunicação.
10 O relatório pode ser acessado em https://www.oas.org/en/iachr/decisions/court/2017/12685FondoEn.pdf. [Último acesso em 02/02/2020].
11 Sobre a decisão da Corte, recomendamos uma análise crítica feita por Daniel Cerqueira. (CERQUEIRA,D. “Estándar de prueba y argumentación jurídica em la era de la posverdad”, 13/06/2019. Blog Justicia em Las Américas. Disponível em https://dplfblog.com/2019/06/13/estandar-de-prueba-y-argumentacion-juridica-en-la-era-de-la-posverdad-comentarios-a-la-sentencia-de-la-corte-interamericana-en-el-caso-arrom-suhurt-y-otros-vs-paraguay/[ último acesso em 03/08/2019]). E sobre a avaliação e valoração de provas pela Corte, recomendamos o texto de Ana Belem García Chavarría (CHAVARRÍA, A.B.G. “Debates sobre la prueba en el litício ante la Corte Interamericana”. Anuario Mexicano de Derecho Internacional, vol. XIX, 2019, pp. 293-325).
12 Para mais informações sobre os processos, há um informe da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (disponível em https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/noticias/decisao-sobre-refugiados-politicos-no-brasil-e-contestada-pelo-estado-paraguaio) [Último acesso em 23/07/2019].
13 A decisão pode ser consultada na página da Organização dos Estados Americanos (OEA). Disponível em http://www.oas.org/es/cidh/prensa/comunicados/2017/216.asp [Último acesso em 22/07/2019]
14 O parecer foi disponibilizado para os próprios interessados e seus procuradores, bem como para membros da Plenária e seus assessores. Ele foi discutido na sessão plenária do CONARE, referida no texto. No entanto, não está publicado nem disponível para acesso.
15 Artigo 38, V, da Lei 9.474/97.
16 Artigo 1º, item C, 5, da Convenção de 1951 Relativa ao Estatuto dos Refugiados.
17 As orientações referidas constam do Manual de Procedimento para a Determinação da Condição de Refugiado de Acordo com a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 Relativos ao Estatuto dos Refugiados, cuja versão em português está disponível em https://www.acnur.org/portugues/wp-content/uploads/2018/02/Manual_de_procedimentos_e_para_a_determinacao_da_condicao_de_refugiado.pdf. [último acesso em 23/07/2019].
18 Manual de Procedimento para a Determinação da Condição de Refugiado de Acordo com a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 Relativos ao Estatuto dos Refugiados, item 135.
19 Manual de Procedimento para a Determinação da Condição de Refugiado de Acordo com a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 Relativos ao Estatuto dos Refugiados, item 136.
20 Sobre este episódio, há informações disponíveis no site do ACNUR (https://www.acnur.org/portugues/2012/07/03/cessacao-para-refugiados-angolanos-e-liberianos-pode-alterar-perfil-do-refugio-no-brasil/) e há uma normativa específica, expressa na Portaria 2650/2012, do Ministério da Justiça (disponível em https://www.justica.gov.br/seus-direitos/migracoes1/legislacao/portarias/portaria-mj-no-2-650-de-25-de-outubro-de-2012.pdf) [último acesso em 23/07/2019].
21 O Ministro da Justiça Sergio moro fez o comentário em sua conta do Twitter, disponível em https://twitter.com/SF_Moro/status/1153636162139033600 [ último acesso em 23/07/2019].
22 ˜Brasil avalia cancelar refúgio a paraguaios condenados pela justiça. Agência Brasil EBC. 12/03/2019. Disponível em http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2019-03/brasil-avalia-cancelar-refugio-paraguaios-condenados-pela-justica [Último acesso em 20/07/2019].
23 Um dos grandes capitais do atual governo do está vinculado à ruptura com a cultura política institucional anterior, o que implica, dentre outras coisas, posicionamentos manifestamente à direita no espectro político e ideológico, o que ele e seus principais auxiliares fizeram questão de destacar sempre que puderam. O envolvimento de figuras importantes do anterior governo em episódios graves de corrupção deu ao atual Presidente elementos para obter apoio dos eleitores, na medida em que se anunciava como uma ruptura com o antigo sistema corrompido (ele buscava se mostrar como um elemento anti-sistema), preocupado com o enfrentamento da corrupção. A escolha de um juiz responsável pela operação “Lava Jato” reforçou esta imagem. Para muitos críticos, ao lado da agenda contra corrupção, o governo assumiu uma agenda abertamente refratária às conquistas obtidas por grupos minoritários, o que não difere de sua agenda enquanto parlamentar, antes de sua ascensão ao cargo de Chefe do Executivo.
24 O Senador Fernando Bezerra (MDB/RO) apresentou emendas ao projeto inicial, acrescentado propostas que implicam em restrição de entrada, diminuição de garantias e prisão administrativa, dentre outras coisas. Declarou publicamente que a Emenda atende interesses do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
25 As palavras do Senador podem ser conferidas no registro em vídeo da sessão, disponível em https://www12.senado.leg.br/multimidia/evento/89303?h=09:36:11 [último acesso em 03/08/2019].
26 Trata-se da Portaria 666, de 25/07/2019, do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
27 Marcia Anita Sprandel fez uma análise relevante dos “bastidores” da aprovação da nova Lei de Migração Lei 13445/17 (SPRANDEL, M. A. “Leis migratórias e conservadorismo parlamentar no Brasil: o caso da Lei 13.445, de 2017”. In ACNUR/IMDH. Cadernos de Debates: Refúgio, Migrações e Cidadania, v.13. dezembro de 2018.p. 37-60) e também analisou os discursos que fundamentaram o antigo Estatuto do Estrangeiro, com destaque especial para a doutrina de segurança. (SPRANDEL, M. A. “Migração e crime: a Lei 6.815, de 1980”. REMHU, Revista Interdisciplinar de Mobilidade Humana, 2015, v. 23. N.45, p. 145-168).
28 Referência ao fato de que a plenária do CONARE é composta não apenas por representantes de instituições do Estado, mas também por representantes do ACNUR, da DPU, do MPF e da Sociedade Civil, este, com direito a voto. A este respeito, o artigo 14, da Lei 9.474/97, define a composição da Plenária.
29 A Lei 13.445/17 revogou e substitui o antigo Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80), promulgada durante o regime militar no Brasil e que tratava o tema a partir sobretudo da perspectiva de segurança e respeito à soberania.
30 Os dados sobre número de solicitações de refúgio, deferimentos e indeferimentos de pedidos de refúgio, bem como a resposta ao fluxo de venezuelanos podem ser consultados no relatório do CONARE, disponível em https://www.acnur.org/portugues/wp-content/uploads/2019/07/Refugio-em-nu%CC%81meros_versa%CC%83o-23-de-julho-002.pdf. [Último acesso em 02/02/2020].
31 Alguns dos obstáculos enfrentados pelos refugiados e seus familiares na obtenção de vistos foi analisado pela pesquisadora Patrícia Nabuco Martuscelli, em sua tese de doutorado “Refúgio significa saudades”: A Política Brasileira de Reunião Familiar de Refugiados em Perspectiva Comparada (1997-2018)”, defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, na FFLCH/USP.
32 Dados sobre o fluxo de venezuelanos chegando ao Brasil pela fronteira norte podem ser acessados na plataforma R4V, disponível em https://r4v.info/es/situations/platform/location/7509. [Último acesso em 02/02/2020].
33 “Conare. Refúgio em números. 3ª edição”. Disponível em https://www.acnur.org/portugues/wp-content/uploads/2018/04/refugio-em-numeros_1104.pdf [último acesso em 23/07/2019].
34 De acordo com a definição contida no artigo 1º da Lei 9.474/97, será considerado refugiado “ todo indivíduo que: I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país”
35 A notícia sobre a decisão foi antecipada em sessões anteriores da Plenária e era de conhecimento da maior parte dos atores envolvidos no tema, antes mesmo de sua formalização
36 A definição ampliada do refugiado está descrita e normatizada no inciso III, do artigo 1º da Lei 9.474/97, que acolheu, em parte, a definição criada pela Declaração de Cartagena, de 1984. Esta definição foi aplicada para solicitantes que fugiram de países em conflito, como foi o caso dos angolanos, liberianos, sírios, mas também para congoleses que fugiram de regiões atingidas por guerras em seu país. Por abrir oportunidade para o reconhecimento coletivo de grupos inteiros de solicitantes, esta medida é sempre utilizada com bastante reserva e quase sempre depois de muitos embates e negociações. Na sessão acima indicada, 174 venezuelanos foram reconhecidos refugiados com base na definição ampliada.
37 Sobre as decisões do CONARE sobre os pedidos de refúgio e as suas motivações, os dados podem ser encontrados na “Plataforma Interativa de Decisões sobre Solicitações da Condição de Refugiado no Brasil”, desenvolvida pelo ACNUR em parceria com o CONARE, disponível em https://www.acnur.org/portugues/dados-sobre-refugio/dados-sobre-refugio-no-brasil/. [último acesso em 0307/2019]. Alguns dados e informações podem ser encontradas também na publicação “O Reconhecimento dos Refugiados pelo Brasil. Decisões comentadas do CONARE”. ZERBINI, Renato (Org). ACNUR, 2007. E nas dissertações de Aryadne Bittencourt e de Larissa Getirana. GETIRANA, Larissa Moura. “As entrevistas de elegibilidade no processo de refúgio brasileiro”. Dissertação de mestrado. Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (2019). WALDELY, Aryadne B. “Narrativas da ‘vida em fuga’: a construção política-jurídica da condição de refugiado no Brasil”. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade Nacional do Rio de Janeiro, (2016).
38 A distinção entre solicitantes “verdadeiros” e “falsos” é tema de importantes análises na literatura estrangeira, como em TICKTIN, Miriam (2015) e FASSIN, Didier (2012), e também na recente produção acadêmica nacional, como em GETIRANA, Larissa (2019), WALDELY, Aryadne (2016).
39 A Portaria 666/2019, do Ministério da Justiça e Segurança Pública regula, dentre outras coisas, o alcance dos impedimentos previstos no § 2º do art. 7º, da Lei nº 9.474/97, ao definir quem são os refugiados perigosos e impedidos de solicitar refúgio.
40 O caso do turco Ali Sipahi, cuja extradição está em julgamento no STF, foi amplamente divulgado na mídia, assim como a situação da comunidade de turcos. “STF devide soltar turco preso no Brasil após pedido de extradição”. Folha de São Paulo. 27/06/2019. (Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/05/stf-decide-soltar-turco-preso-no-brasil-apos-pedido-de-extradicao-de-erdogan.shtml) e “Opositor de Erdogan preso no Brasil preocupa comunidade turca”. O Globo. 25/04/2019 (Disponível em https://oglobo.globo.com/mundo/opositor-de-erdogan-preso-no-brasil-preocupa-comunidade-turca-23622134) [último acesso em 26/07/2019].
41 “Syrian toddler Aylan´s father drove capsizes boat, passengers say”. Reuters. 11/09/2015. (Disponível em http://www.reuters.com/article/us-europe-migrants-turkey-iraq-idUSKCN0RB2BE20150911) (Último acesso em 11/04/2016) e “Aylan Kurdi´s father denies claims he was a people smuggler and driving boat that capsized and led to son´s death”. Independent. 13/09/2015 (Disponível em http://www.independent.co.uk/news/world/middle-east/aylan-kurdi-s-father-denies-claims-he-was-a-people-smuggler-and-driving-boat-that-capsized-and-led-10498798.html) (Último acesso em 03/08/2019).
42 As cláusulas de exclusão estão previstas nos incisos do artigo 3º da Lei 9.474/97. Em especial, o inciso III trata da exclusão daqueles que tenam cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas. E o IV, dos que sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas.
43 Como a maior parte das pessoas que foge não é capaz de trazer provas do alegado fundado temor de perseguição, o seu depoimento se torna o principal ou o único meio de prova. Por esta razão, o depoimento do solicitante se torna, na maior parte dos casos, o momento mais importante do processo. E, nestes termos, a credibilidade do depoimento é um dos critérios capazes de decisão. As regras para análise e avaliação das provas e da narrativa dos solicitantes não constam de lei ou de resoluções, mas em diretrizes e orientações feitas pelo ACNUR.

Autor 

Fabrício Toledo de Souza Pós-Doutorado em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, com apoio e financiamento do CNPq, atua em organizações não-governamentais no atendimento a refugiados, solicitantes de refúgio e outros deslocados. E-mail: fabriciotsouza777@gmail.com
 

Um arremedo de democracia

por Raphaëlle Bail – Le Monde Diplomatique
1 de junho de 2003
 
 

Suspeitos de terem organizado o seqüestro da mulher de um rico empresário, dois membros do movimento Pátria Livre foram encontrados presos e torturados. O poder paraguaio foi pego em flagrante. Seu aparelho de repressão, com métodos herdados da ditadura, continua na ativa.Raphaëlle Bail

Aos 13 anos de idade, a “democracia” paraguaia está mergulhada desde fevereiro de 2002 numa novela político-judiciária macabra e rocambolesca. Enquanto María Edith Debernardini, mulher de um rico empresário, desapareceu há várias semanas, os investigadores dos serviços de polícia judiciária explicam que ela foi vítima de ativistas de um movimento político de esquerda que optou por se financiar através dos seqüestros. As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), acrescentam eles, não procedem desta maneira?

Dois “suspeitos”, Juan Arrom, membro dirigente do movimento Pátria Livre (fundado em 1990) e Anuncio Martí, jornalista e militante do mesmo movimento, são nominalmente citados. Mal são assim designados e desaparecem. Eles têm o perfil perfeito de culpados em fuga. Suas famílias e as mídias que cobrem o caso acabariam por lhes encontrar in extremis, prisioneiros e torturados numa mansão nos subúrbios de Assunção.

Puro stroessnerismo

Por que a polícia fez tudo para impedir as famílias de encontrar as duas vítimas e o governo se obstinou em fazer de Arrom e Marti culpados, acusando-os de ter organizado seu próprio seqüestro?

As questões não tardam a despontar: por que, antes deste epílogo, a polícia fez tudo para impedir as famílias de encontrar as duas vítimas? Por que o governo se obstinou em fazer de Arrom e Marti culpados, acusando-os de ter organizado seu próprio seqüestro? Extenuado, com as marcas da tortura ainda visíveis em seus punhos, Arrom daria sua versão dos fatos. “Fui detido pela polícia. Quiseram me indiciar, com meu movimento, por seqüestro e me fazer confessar uma conspiração imaginária contra o governo, que incluiria o Pátria Livre e todos os outros partidos de oposição. No fundo, este método é puro stroessnerismo”.

O poder paraguaio foi, então, pego em flagrante: herdada da época do ditador Alfredo Stroessner, sua natureza profundamente repressiva apareceu cruamente. Está a cada dia um pouco mais evidente que os dois homens foram vítimas do aparelho repressivo do Estado.

Com o retorno da democracia no Cone Sul, o Paraguai parecia se alinhar a seus vizinhos: em 1989, Alfredo Stroessner, forçado ao deixar o poder depois de 35 anos, deixou atrás de si uma das ditaduras mais negras e mais cruéis da região. Ao menos 150 mil pessoas teriam passado pelas prisões da ditadura e se contabiliza de mil a três mil mortos e desaparecidos num país de 5,6 milhões de habitantes1

 

Caso Arrom e Martí: CIDH condena Estado paraguaio e o demanda perante Corte Interamericana

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA resolveu, segundo informações do seu site oficial, condenar o Estado paraguaio no Caso 12.685. No mesmo o Paraguai já era réu no sistema interamericano de direitos humanos desde o ano 2008, quando a CIDH decidiu admitir a demanda pelos fatos de terrorismo de Estado, sequestro e torturas a que foram submetidos os líderes do movimento Patria Libre do paraguai. Juan Arrom e Anuncio Martí mais vários familiares são considerados vítimas do Estado paraguaio pelo acionar delitivo das forças de segurança policiais, do governo e do Ministério Público.

A decisão da CIDH para demandar o Estado paraguaio perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA obedeceria ao fato de não serem satisfatórios os retornos do governo paraguaio em relação às sanções já impostas pela Comissão para a reparação dos danos e ressarcimentos morais, políticos e econômicos às vítimas. Nesse caso, as penalidades de ordem moral e econômicas que já foram impostas pela CIDH e cujo conteúdo é mantido sob sigilo, podem ser ainda mais fortes na instância da Corte. É usual que a Comissão Interamericana só leve perante a Corte casos de extrema gravidade e com grande robustez de provas para condenar o réu, neste caso, o Estado paraguaio.

CIDH condena Estado paraguaio no Caso 12.685 e o demanda perante a Corte Interamericana

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *