O valor de nossas vidas

Sérgio Sérvulo *

A pandemia nos põe ante o valor de nossas vidas.

Tem-se a impressão de que a mortandade faz diminuir o seu valor.­

E nós nos encolhemos, para não nos ver no espelho. Para escapar a esse opróbrio. Como nos campos de concentração, onde os superhumanos se comprazem sobre os dejetos subhumanos.

Realmente, pode-se afirmar, com ares de verdade, que a vida humana não vale nada.

Mas pode-se dizer também – vejam o paradoxo – que ela, e só ela vale. Que ela é tudo que vale.

Na visão de cada indivíduo, nada mais valioso do que a própria vida, sua história, suas vivências. E tem razão porque, morrendo, para ele acabam todas as coisas.

Mas ao mesmo tempo não tem razão: a subjetividade, que lhe confere essa certeza, é doadora de objetividade: vida alguma vale mais, nem menos, do que a sua. E, independentemente do que tenha realizado, cada um é mais importante do que possível, ou seja, em grau infinito.

Toda e cada vida está no mundo, no qual vive e se esgota, neste tempo e neste espaço. Mas, assim como a subjetividade se abre para a objetividade, a imanência se abre para a transcendência. Se o valor se mede com referência a algo, a vida só pode ser medida com referência ao que esteja fora dela, por cima dela.

Não é preciso ser religioso para ter noção do sagrado. Nem para ter, da vida, a percepção em que reconhecemos, no outro, quinhão essencial.

Dostoiévski se enganou ao dizer que, se Deus não existisse, tudo seria permitido. A moral não é um cabresto. Em livro que escrevi, mas ainda não publiquei, proponho, para ela, um fundamento não individualista. Realmente, sob o paradigma individualista, a necessidade de cumprimento da lei moral põe-se como uma espécie de ascese, a busca de Deus, num esforço de superação da natureza humana. Mas, sendo isso uma exceção, em geral o indivíduo gasta a vida buscando bens incapazes de satisfazer sua ânsia, e morre achando que não viveu quanto devia.

Ao assumir esse novo paradigma (a humanidade) o indivíduo vira pessoa, e incorpora os valores suprahistóricos, em desenvolvimento, desde que o mundo é mundo, ou desde sempre, em seu projeto.


* membro da Comissão Brasileira Justiça e Paz. 

Foi professor de Direito Civil na Faculdade de Direito de Santos (Unisantos), de 1966 a 1983; colaborador dos jornais A Tribuna (de Santos) e Cidade de Santos; sócio fundador do Instituto de Estudos Pontes de Miranda (1976); presidente da Sub-Secção de Santos da OAB (1981 – 1983), e, nessa qualidade, presidente da Comissão pela Autonomia de Santos; coordenador do Departamento de Estudos e Pesquisas da OAB-SP (1983-1985); colaborador da revista “Pequenas Empresas, Grandes Negócios”; coordenador, em Brasília, do Bureau de Acompanhamento da Constituinte, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (1987 – 1988); vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal da OAB (1987-1988); representante da OAB nacional no Movimento pela Ética na Política e no Fórum Nacional contra a Violência no Campo; funcionou como um dos advogados de acusação no processo de impeachment do presidente Collor; membro da Comissão de Direitos Humanos e da Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB (1997-1998). Secretário Municipal de Assuntos Jurídicos, de janeiro de 1989 a abril de 1990; Vice-Prefeito do Município de Santos (1989-1992), na gestão Telma de Souza; candidato a deputado federal, em 1990; assessor da presidência do Conselho Federal da OAB, nas gestões de Ophir Cavalcante, Marcello Lavenère, e José Roberto Batochio; foi membro do Secretariado Internacional de Juristas para a Anistia e Democracia no Paraguai (SIJADEP) e da Comissão Permanente de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros, da Associação Brasileira de Constitucionalistas Democratas, e do Conselho Diretor do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro; membro da Deutsch-Brasilianische Juristenvereinigung e.v., tendo figurado como conferencista nos congressos de 1997, 2000, 2003, 2005 e 2011; Chefe de Gabinete do Ministro da Justiça, Dr. Márcio Thomaz Bastos (2003 – 2004); Doutor Honoris Causa pela Faculdade de Ciências Sociais de Florianópolis (outubro de 2011).

 

         Autor das seguintes obras:

 

“Direito de família. Mudanças”. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1985;

“O que é voto distrital”. Porto Alegre, Sérgio A. Fabris, 1992;

“A OAB e o impeachment” (org.) Brasília, OAB, 1992;

“Revisão constitucional” (org.). Porto Alegre, Sérgio A. Fabris, 1993;

“O efeito vinculante e os poderes do juiz”, São Paulo, Saraiva, 1999; Esta obra está esgotada.

“Manual das eleições” (co-autor: Roberto Amaral). São Paulo, Saraiva, 2002;

“Dicionário Compacto do Direito”, São Paulo, Saraiva, 2002;

“Estudos de Direito Constitucional, em homenagem a José Afonso da Silva” (co-organizador Eros Roberto Grau), São Paulo, Saraiva, 2003;

“Fundamentos de Direito Constitucional”, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2004;

“Princípios constitucionais”, São Paulo, Saraiva, 2006;

“Fundamentos de Direito Constitucional”, vol. II, São Paulo, Saraiva, 2008;

“Uma Deusa Chamada Justiça”, São Paulo, Wmf Martins Fontes, 2009;

“Recurso Extraordinário e Recurso Especial”, São Paulo, Saraiva, 2010;

“Ética”, São Paulo, Saraiva, 2012. Esta obra está esgotada.

“Reforma política” (disponível neste site)

Investigação sobre o possível, Barra Livros, 2015

Antropologia Cristã, Barra Livros, 2016

Introdução à filosofia e outros escritos, 2017

Abaixo a censura, Barra Livros, 2017

Dever constitucional de fundamentar, Editora Fabris, 2018

Nascimento do liberalismo, Barra Livros, 2020

       Autor de inúmeros artigos jurídicos, publicados em revistas especializadas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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