No jornal EL PAÍS de hoje (19/5/21), uma reportagem de Regiane Oliveira ouve quem mais importa no debate sobre o fechamento das escolas: os alunos. “Os adultos deveriam ouvir as opiniões das crianças, porque na escola corremos risco de nos contaminar. E se isso acontecer, não é possível ficar internado, porque os leitos de UTI estão cheios, o oxigênio está acabando para quem precisa. É melhor que as crianças fiquem em casa”, diz Isis Samantha dos Santos Viana, de 11 anos. A ONU também foi atrás desse público para definir como a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente se aplica ao ambiente digital. Mais de 709 crianças de 29 países foram ouvidas.
Autoridades públicas, governadores e prefeitos, estão determinando o retorno às aulas, sem ouvir estudantes e os/as trabalhadores/as em educação. Não está sendo levado em consideração o direito à vida e nem observadas as salvaguardas necessárias. A seguir, oferecemos como subsídio (enviado por uma professora que não pode se identificar por causa das retaliações que as pessoas de posições críticas estão sofrendo) ao debate uma breve análise de um projeto de lei que está sendo votado na Câmara dos Deputados “proibindo o fechamento de escolas e universidades”.
Essencial, é a vida! PL 5595/2020 , nada a contribuir para a Educação
A urgência na tramitação do Projeto de Lei 5595/2020, de autoria das Deputadas Paula Belmonte (Cidadania-DF) e Adriana Ventura (Novo-SP), cujo texto reconhece a Educação Básica e o Ensino Superior como serviços e atividades essenciais, proibindo o fechamento de escolas e universidade durante a pandemia, traz à tona importantes reflexões.
O PL busca dar destaque à essencialidade ou não da educação Básica e Universitária em tempos de pandemia. O que não é questionável quando se observa somente o caráter e a importância da educação. Mas, em primeiro lugar, o PL não leva em consideração o trabalho educativo nas escolas, que não parou. As instituições públicas e privadas têm desenvolvido alternativas e adaptações, sem deixar de exercer as atividades educativas desde o início da pandemia.
É fundamental que se reconheça o esforço dos profissionais da educação na criação e na manutenção das aulas em formato à distância com relativo sucesso. Em grande parte das vezes ao custo de um sobretrabalho e uma dedicação sem igual dos/as professores/as e técnicos/as, cujos salários nem sempre são sequer suficientes para custear sua alimentação. Devemos reconhecer que, especialmente no caso das escolas públicas, sem equipamentos, sem formação prévia e sem condições de trabalho, são pequenos milagres produzidos por uma classe pouco valorizada e respeitada.
É preciso refletir sobre a quem interessa o retorno das atividades escolares no formato presencial.
A questão da “essencialidade” é um dado menor, se considerarmos os reais desafios que a pandemia aponta para a educação brasileira. A questão deveria ser: O que fazer para se garantir os recursos necessários à Educação Pública, com ou sem pandemia? Esse debate não é realizado, ao contrário, as autoridades fogem dele. Perdem-se nos discursos de “achômetros” de interesses eleitoreiros políticos, e de interesses econômicos de instituições e corporações privadas, que tentam forçar a abertura das escolas no momento de maior número de mortes no país e baixo percentual de imunização da população.
Importa compreender que a pandemia desnudou ainda mais a precariedade das escolas públicas brasileiras pela ausência de prioridades orçamentárias desde antes da pandemia. Expôs o quadro deficitário de muitas escolas sem o mínimo de condições de atender com qualidade os estudantes, seja de forma presencial ou remota. Quem se importa com a Educação na Pandemia, deveria também se importar antes de mais nada, se as escolas estão em condições de oferecer a segurança necessária aos estudantes, profissionais da educação, auxiliares e famílias. Garantir a vida, deveria ser antes de tudo, o essencial não é mesmo?
É certo que pandemia também aumentou a miséria no nosso país. A fome é o um grande inimigo que estudantes encontravam alento no lanche oferecido pelas escolas. Lembre-se ainda, lanche esse, muitas vezes garantido e ou complementado pela iniciativa e solidariedade dos próprios profissionais de educação.
A adequação às novas estratégias de ensino remoto, também trouxe muitos desafios para os profissionais da educação e estudantes, especialmente pela ausência de formação tecnológica e de equipamentos básicos como computadores e internet nas escolas. Porém, a situação de vulnerabilidade social e econômica que sempre existiu, e em que estão inseridos grande parcela dos estudantes, sem acesso a aparelhos de celulares , equipamentos e internet, dificultam ainda mais o sucesso das novas estratégias e iniciativas produzidas pelos profissionais da educação. Muitos inclusive, nas mesmas condições de seus alunos e agravadas pelo excesso de trabalho, e o medo da contaminação.
Nessa perspectiva, o Projeto de Lei 5595/2020, nada tem a contribuir a educação no Brasil, e pelo contrário, reduz e ignora o direito à vida, e à educação com qualidade para todos e todas, especialmente para a educação pública.
Sem vacina, e sem condições de segurança contra o Covid nas escolas e fora dela, sem iniciativas e recursos orçamentários para a redução das desigualdades sociais na pandemia, abrir as escolas é o que menos importa nesse momento. Essencial, é a vida!