Nota Pública em Defesa da Lei: A tortura é expressamente proibida em território brasileiro

Uma ampla rede de entidades da sociedade civil organizada, movimentos sociais, de defesa de direitos e da legalidade de Goiás, com a solidariedade de mais 17 estados brasileiros (Paraíba, Rio Grande do Norte, Sergipe, Rio Grande do Sul, Amazonas, Rio de Janeiro, Piauí, Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rondônia, Distrito Federal, Ceará, Pernambuco e Tocantins) manifestaram-se contra a situação de violência e desrespeito à lei no sistema prisional goiano por meio da “Nota Pública em Defesa da Lei: a tortura é expressamente proibida em território brasileiro”, que foi assinada por 141 organizações.

A informação é publicada por Pastoral Carcerária, 13-01-2022.

Além de denunciar o alarmante aumento de 126% dos casos de torturas nos presídios de Goiás, as entidades cobram do governo do estado a sua imediata apuração, incluindo as que envolvem o atual policial penal Josimar Pires Nicolau do Nascimento, recentemente nomeado para o cargo de diretor-geral de Administração Penitenciária de Goiás e seu antecessor tenente-coronel da PM Franz Rasmussen Rodrigues.

Nascimento confessou a prática de torturaconforme noticiou o El País, na reportagem “Pisei, dei murro na cara”, a confissão de maus-tratos de um gestor de 14 presídios de Goiás”, publicada no dia 22 de março de 2021, que teve como base o áudio vazado de uma reunião com servidores da Penitenciária Odenir Guimarães, em Aparecida de Goiânia. Já Rodrigues foi acusado por 130 presos de “ditar as regras” de um esquema de tortura dentro do sistema prisional, em carta assinada por 130 presos do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia.

A nota cita a legislação que proíbe expressamente a prática da tortura no país, como a Constituição Federal, segundo a qual “ninguém será submetido a tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”; do Código Penal Brasileiro (Decreto Lei n˚ 2.848/1940); e do Código de Processo Penal Brasileiro (Decreto Lei n˚ 3.689/1941), segundo os quais a tortura é crime inafiançável.

E avalia a situação como de “absoluta falta de inteligência no enfrentamento da criminalidade”, questionando o governo do estado: “Em Goiás, a tortura está sendo implementada como um ilusório método de controle, ao arrepio da lei, ao invés da implementação de verdadeiras políticas públicas?”.

Como medidas urgentes, as 141 organizações exigem “o imediato cumprimento do ordenamento jurídico vigente, a substituição do mencionado policial penal por uma pessoa de trajetória insuspeita e comprometida com a implementação de políticas públicas voltadas para a garantia de direitos, em sintonia com as leis vigentes, a dignidade e uma verdadeira reintegração social de todas as pessoas presas; além de uma investigação transparente e imparcial das denúncias e acusações de torturasabusos e negligência no sistema prisional goiano”.

Eis a nota.

Nos últimos anos, diversas entidades da sociedade civil e órgãos oficiais de monitoramento do sistema prisional apresentaram inúmeras denúncias de violações de direitos no sistema prisional em Goiás. O banco de dados da Pastoral Carcerária Nacional indica que as denúncias de tortura saltaram de onze casos em 2020 para 26 no ano de 2021, representando um aumento de mais de 126%. Podemos afirmar  que as denúncias envolvendo agressões físicas e verbais, uso de instrumentos de tortura, spray de pimenta, bomba de gás lacrimogêneo, bala de borracha, violações do direito à visita das famílias, falta de assistência material, à saúde, falta de alimentação e água, incomunicabilidade, dentre outras violações de direitos, mais que dobraram nos últimos dois anos.

Esses números mostram o avanço e a ampliação da política de violência adotada pelo Estado no cárcere goiano. Segundo informações da Pastoral Carcerária Nacional, Goiás ocupa a 3ª posição no ranking dos estados que são os mais denunciados em todo o país.

Diante de uma infindável avalanche de denúncias feitas por diversas entidades, especialmente de maus tratos, abusos de autoridade, negligência e violência apresentadas por presos do sistema prisional de Goiás e seus familiares, manifestamos nossa perplexidade e repúdio à nomeação do policial penal Josimar Pires Nicolau do Nascimento para o cargo de diretor-geral de Administração Penitenciária de Goiás, apesar da ampla publicidade dada ao vazamento do áudio de uma reunião com servidores da Penitenciária Odenir Guimarães, em Aparecida de Goiânia, no qual ele confessa a prática de tortura contra presos, relata uma série de violências cometidas, como agressões físicas e psicológicas, uso de instrumentos torturantes e armamentos, além de ameaçar de morte colegas que o denunciem.

Essa confissão chocante foi publicada pelo El País, na reportagem “Pisei, dei murro na cara”, a confissão de maus-tratos de um gestor de 14 presídios de Goiás”, publicada no dia 22 de março de 2021. 

Em um ambiente de sistemático desrespeito à lei e denúncias rotineiras de graves abusos e violações de direitos contra detentos em Goiás, que não são apuradas com rigor, a exoneração do tenente-coronel da PM Franz Rasmussen Rodrigues, suspeito de corrupção e acusado por 130 presos de “ditar as regras” de um esquema de tortura dentro do sistema prisional, seria motivo de comemoração e esperança de que finalmente o governo do estado fosse obedecer a Lei 9.455/1997, que define os crimes de tortura.

Entretanto, a indicação de um “torturador confesso”, conforme o áudio vazado pelo El País, para ocupar o cargo de diretor-geral de Administração Penitenciária, é absolutamente inadmissível quando existe um mínimo de respeito à legalidade e ao ordenamento jurídico que proíbe a prática de tortura no Brasil e em Goiás.

Assim, causa estranheza e desconfiança que, diante desses fatos graves e públicos, o governador Ronaldo Caiado tenha nomeado justamente uma pessoa suspeita de ter cometido crimes graves no exercício de sua função no sistema prisional. Diante disso, nos sentimos obrigados a perguntar se, talvez, não seja esse o conjunto de “qualidades” que o governo do estado espera encontrar em alguém designado para ocupar o cargo em questão, uma vez que ignora as denúncias feitas. Em Goiás, a  tortura está sendo implementada como um ilusório método de controle, ao arrepio da lei, ao invés da implementação de verdadeiras políticas públicas?

Nesse ambiente trágico e de absoluta falta de inteligência no enfrentamento da criminalidade, nos cabe exigir também o cumprimento do inciso III do artigo 5˚ da Constituição Federal, segundo o qual “ninguém será submetido a tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”; do Código Penal Brasileiro (Decreto Lei n˚ 2.848/1940); e do Código de Processo Penal Brasileiro (Decreto Lei n˚ 3.689/1941), segundo os quais a tortura é crime inafiançável.

E finalmente, os artigos 5º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 7º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, que determinam que ninguém será sujeito à tortura ou à pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante; a Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas CruéisDesumanos ou Degradantes, aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 9 de dezembro de 1975; entre outras legislações, incluindo os próprios regramentos internos das unidades prisionais.

Exigimos o imediato cumprimento do ordenamento jurídico vigente, a substituição do mencionado policial penal por uma pessoa de trajetória insuspeita e comprometida com a implementação de políticas públicas voltadas para a garantia de direitos, em sintonia com as leis vigentes, a dignidade e uma verdadeira reintegração social de todas as pessoas presas; além de uma investigação transparente e imparcial das denúncias e acusações de torturas, abusos e negligência no sistema prisional goiano.

Goiânia, 13 de janeiro de 2022

Pastoral Carcerária Nacional

Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil

Comitê Goiano de Direitos Humanos Dom Tomás Balduino

Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT)

Justiça Global

Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Criminalidade e Violência – Necrivi/UFG

Comitê Brasileiro de Defensores e Defensoras de Direitos Humanos -CBDDH

INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos

Comissão Pastoral da Terra (CPT) – Regional Goiás

Movimento Nacional de Direitos Humanos Goiás

Pastoral Carcerária Estadual de Goiás

Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD GO

Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ

Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – MNMMR

Movimento de Meninos e Meninas de Rua de Goiás – MMMR-GO

ASSIBGE – Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Fundações Públicas Federais de Geografia e Estatísticas – Goiás

Movimento Nacional da População em Situação de Rua – Goiás

Movimento dos Policiais Antifascismo Goiás

Central de Movimentos Populares de Goiás

Movimento de Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos Goiás

Instituto Brasil Central – IBRACE

Rede de Proteção às Pessoas em Vulnerabilidade

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

MNU – Movimento Negro Unificado Nacional

Pastoral Carcerária Regional Oeste 1 MS

Pastoral Carcerária Nacional para Questão da Mulher Encarcerada

CRB Regional Goiânia

AMPARAR

ITTC – Instituto Terra Trabalho e Cidadania

Serviço Pastoral dos Migrantes Nacional

Liberta Elas

Pastoral da Mulher Marginalizada Nacional

Pastoral do Povo da Rua Nacional

Pastoral Operária Nacional

Rede Nacional de Mães e Familiares de Vítimas do Terrorismo do Estado

Grito dos/as Excluidos/as Brasil

Associação dos Familiares e Amigos de Pessoas Privadas de Liberdade do Estado de Goiás

Instituto Anjos da Liberdade Goiás

Associação Devir Social Goiás

Rede de Mães e Familiares da Baixada Fluminense

ASTRAL GOIÁS

Instituto DH

NUDISS/UFF- Núcleo de Pesquisa e Extensão em Direitos Humanos, Infância,

Juventude e Serviço Social da Universidade Federal Fluminense

Frente Paraense pelo Desencarceramento

Elas Existem Mulheres Encarceradas – RJ

CEMADIPE – Goiás

AMUGUE – Associação de Mulheres Guerreiras – RJ

Centro de Direitos Humanos Dom Jaime Collins – GO

ABRASME CENTRO OESTE

Centro de Formação Integral – GO

AFAPARO – Associação dos Familiares dos Presos de Rondônia

Associação de Familiares e Amigos de Presos e Egressos (AFAPE) – SP

Instituto das Irmãs Missionárias de Cristo – Goiânia

Congregação de São Pedro Ad Vincula – Goiânia

Instituto de Cidadania e Direitos Humanos – MG

Irmãs de São José de Rochester – GO

Fórum Permanente de Saúde do Sistema Penitenciário do Rio de Janeiro

Associação Canários Senzala

Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos

Movimento Nacional de Direitos Humanos – Articulação Piauí

Frente Estadual pelo Desencarceramento do ES

Iniciativa Direito a Memória e Justiça Racial – RJ

Coletivo Escuta Liberta – SP

Leitura Liberta – SP

Coletivo Escuta Liberta – SP

Frente Estadual pelo Desencarceramento do Amazonas

Coletivo de Terapeutas Solidários

Cooperativa Libertas – SP

Mujeres de Frente – Ecuador

Tod@s Unidas – RJ

Grupo Recomeço – PR

Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis

CDDH Dom Tomás Balduíno de MARAPÉ (ES)

Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais na Bahia.

6ª Semana Social Brasileira

Coletivo de Familiares e Amigos de Presos e Presas do Amazonas

Assessoria Popular Maria Felipa – MG

ColetivoRJ Memória Verdade Justiça e Reparação

Juventude Manifesta Amazonas

Pastoral Carcerária Bento Gonçalves – RS

FAOR – Fórum da Amazônia Oriental

Coletivo Mães pela Paz – GO

Coletivo Rosas no Deserto de Familiares, Amigxs e Sobreviventes do Sistema Prisional – DF

Coletivo Vozes de Mães e Familiares do Sistema Socioeducativo e Prisional do Ceará

CBJP – Comissão Brasileira Justiça e Paz

Rede Brasileira de Conselhos – RBdC

Instituto Prios de Políticas Públicas e Direitos Humanos

Instituto Irmas da Reparação – GO

Rede Um Grito pela Vida-CRB – GO

Irmãs de Caridade de Montreal – GO

Centro Educacional Cidadania e PAZ Boa Vista das Missões
Kitembo – Laboratório de Estudos da Subjetividade e Cultura Afro-brasileira

Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Politico

Educafro Regional Rio

Instituto DH

Brigadas Populares

Frente pelo Desencarceramento do Ceará

Pastoral Carcerária de Pernambuco

Pastoral Carcerária de Goianésia

Movimento Estadual de Direitos Humanos do Tocantins

Assessoria Jurídica Universitária Popular (AJUP-UFMG)

Rede Feminista de Juristas – deFEMde

Pastoral Carcerária da Arquidiocese de Belo Horizonte

TRANSCRIM (Núcleo Transdisciplinar Subjetividades, Violências e Processos de Criminalização)
Pastoral Carcerária de Mogi das Cruzes

Frente Estadual pelo Desencarceramento – PI

Pastoral Carcerária de Curitiba

Pastoral Carcerária da Diocese de Serrinha

Pastoral Carcerária Diocese de Três Lagoas – MS

Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas

Pastoral Carcerária Arquidiocesana de Brasília

Rede de Comunidades e Movimento contra Violência – RJ

Frente Estadual pelo Desencarceramento do Rio de Janeiro

Coletivo de Mães e Familiares de Pessoas Privadas de Liberdade de Rondônia

Frente pelo Desencarceramento de Rondônia

Frente Estadual pelo Desencarceramento no PR

Frente Estadual pelo Desencarceramento da Paraíba

Movimento Mães de Acari

Frente Sergipana pelo Desencarceramento Coletivo de Mães de Manaus

Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – Seção Goiás

Frente Estadual pelo Desencarceramento do Rio Grande do Norte

Pastoral Carcerária Diocese de Crato

Núcleo de Mães Vítimas de Violência – RJ

Grupo de Mulheres Bordadeiras da Coroa Elza Santiago – RJ

Central de Movimentos Populares (CMP) – SP

Mães da Dor – SP

Plenária Anistia Rio

Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro

Pastoral Carcerária de Aimorés – MG

Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Luiza Mahin – NAJUP

Luiza Mahin/UFRJ

Pastoral Carcerária de Mamanguape – PB

Comissão Pastoral da Terra Xinguara

CEDECA Sapopemba

Coletivo Por Nós – SP

Fórum Grita Baixada

Movimento Camponês Popular (MCP)

Pastoral Carcerária de Sergipe

Conselho da Comunidade na Execução Penal de Sergipe

Centro Popular da Mulher

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fonte: https://www.ihu.unisinos.br/615931-nota-publica-em-defesa-da-lei-a-tortura-e-expressamente-proibida-em-territorio-brasileiro

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