Os chilenos e as chilenas aprovaram em plebiscito a formação de uma nova constituinte para varrer leis criadas na ditadura de Pinochet
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O voto “sim” para se dar uma nova Constituição ao Chile foi aprovado em massa por eleitores neste domingo (25/10). Com mais de 86% das urnas apuradas, 78,20% aprovaram a criação de um novo texto, substituindo o atual, que foi adotado ainda na ditadura de Augusto Pinochet. Enquanto isso, 21,80% votaram pela permanência da Carta atual.
A consulta contou ainda com uma segunda pergunta sobre o modelo para a elaboração da nova Constituição. Neste caso, 79,21% decidiram por uma convenção constituinte exclusiva, com todos os delegados eleitos pelo voto popular.
A outra opção era o modelo misto, com constituintes eleitos e com parlamentares já no exercício de seus mandatos. Essa alternativa recebeu apenas 20,79%, com 64,20% dos votos apurados.
fonte: https://www.metropoles.com/mundo/chile-comemora-voto-sim-para-dar-nova-constituicao-ao-pais
Constituição de Pinochet é derrotada em plebiscito no Chile neste domingo (25)
Resultado teve ampla participação eleitoral e apoiadores da nova Constituição comemoram nas ruas de Santiago
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Manifestações populares pressionaram por mais direitos e participação popular – Reprodução
Com mais de 90% das urnas apuradas, o Chile comemora um fato histórico na noite deste domingo (25): o fim da Constituição vigente, uma herança da ditadura de Augusto Pinochet e a aprovação de uma nova Constituição.
De acordo com o Serviço Eleitoral do Chile, 78,2% da população votou pela aprovação de uma nova Carta Magna, com rejeição de apenas 21,7% dos eleitores.
A apuração aponta ainda que 79% dos votantes aprovaram a criação de uma Convenção Constitucional, composta totalmente por membros eleitos para redação da nova Carta Magna, contra 20% que defendiam uma Comissão Mista Constitucional, formada por 50% de parlamentares atuais e 50% por representantes eleitos.
A jornada, que durou 12 horas devido às medidas sanitárias para evitar o contágio de covid-19, contou com uma alta participação da população, conforme o esperado.
:: Plebiscito sobre nova Constituição é neste domingo no Chile: saiba o que está em jogo ::
Este domingo esteve marcado pelo espírito insurgente das revoltas que aconteceram no país em outubro de 2019, nas quais o plebiscito aparecia como uma das principais reivindicações dos manifestantes.
Os apoiadores de uma nova Constituição se concentram nas ruas da capital do país, Santiago, para celebrar a vitória popular. Acompanhe:
Acompanhe, ao vivo, a manifestação na Praça Dignidade, no centro de Santiago.
O clima de celebração popular contrasta com a repressão empreendida pelos Carabineros, como é chamada a Polícia Militar chilena. A violência militar marcou os protestos desde o ano passado, cujo um dos casos mais emblemáticos foi o de um garoto empurrado da ponte por um policial em outubro deste ano.
A partir de agora, todos e todas seremos parte da construção de um país mais digno
Em entrevista concedida ao portal argentino Marcha Notícias, a cantora chilena Camila Moreno comenta o significado do plebiscito após os protestos de 2019 e a dimensão histórica da data.
“O plebiscito me deixou muito emocionada, sei que vamos ganhar, confio nas pessoas. Este é um primeiro passo para ter um país mais justo e é o início de uma grande trabalho porque, a partir de agora, todos e todas seremos parte da construção de um país mais digno, disse a cantora.
O que vem depois do plebiscito?
Na votação realizada neste domingo (25), os participantes do plebiscito também decidiram como a nova Carta Magna deve ser redigida.
Após a vitória da aprovação da nova Constituição, o próximo passo será a eleição dos representantes da Comissão Constitucional, programada para abril de 2021.
Nesta data, serão eleitos os 155 representantes que participarão da redação da nova Carta Magna.
Posteriormente, o texto será submetido a um “plebiscito de saída”, isto é, deverá ser ratificado pela população em uma votação obrigatória prevista para o segundo semestre de 2022.
*Última atualização às 22h55.
Edição: Luiza Mançano
Chile rebelde prepara-se para reescrever a Constituição
Um ano depois de uma rebelião que sacudiu as bases do projeto neoliberal, plebiscito definirá, neste domingo, formato da Constituinte. Quem a comporá? Quais seus poderes? Como elites tentam limitar ou mesmo sabotar processo?
Publicado 23/10/2020 às 15:08
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No próximo domingo, dia 25, o povo chileno irá às urnas responder duas perguntas: 1) se quer ou não ter uma nova constituição e 2) que tipo de órgão deve escrevê-la. Essa consulta popular foi uma das principais vitórias do povo chileno que se rebelou em 18 de outubro de 2019 e ocupou durante semanas as ruas de todo país. No auge das manifestações, o presidente direitista Sebastián Piñera disse que o país estava em guerra, apenas poucos meses depois de ter afirmado que o Chile era um oásis de paz e prosperidade na América Latina.
Nesta guerra contra seu próprio povo, Piñera mobilizou todo o aparato repressivo do Estado para reprimir as manifestações e tentar assustar os manifestantes: mais de 30 pessoas foram mortas, 460 tiveram trauma ocular, muitas delas ficaram cegas já que a polícia mirava as balas de borracha na altura dos olhos dos manifestantes, mais de 2 mil pessoas presas e 5 mil vítimas de violações e abusos por parte da polícia. Mesmo assim o povo não deixou as ruas.
Sem nenhuma legitimidade, restando-lhe apenas o apoio da alta elite chilena e das forças repressivas, Piñera ameaçou elevar ainda mais o nível da repressão se os partidos não chegassem a um acordo de pacificação do país. Este “Acordo pela paz”, feito por cima, no Congresso, propôs ao povo chileno decidir sobre a realização de uma convenção constituinte para finalmente substituir a Constituição escrita em 1980 e atualizada em 1988 durante a ditadura de Augusto Pinochet. Afinal, as manifestações não eram somente pelos 30 pesos de aumento no transporte público, mas por 30 anos de abuso, como afirma a principal palavra de ordem da rebelião popular.
Assim originou-se o plebiscito, que deveria ter se realizado em 26 de abril, mas foi adiado para o domingo próximo em virtude da pandemia. Abaixo elenco as principais possibilidades de resultado e seus desdobramentos para o futuro.
- Tende a ser a maior participação eleitoral da história do Chile, apesar da pandemia;
- Até a maior parte das classes dominantes estão apoiando a realização da convenção constituinte, portanto, a vitória eleitoral do “sim” deve ser grande;
- As disputas começam mesmo na segunda pergunta do plebiscito que se refere ao “como” será a constituinte. As classes dominantes querem uma convenção mista, com apenas metade eleita pelo povo e a outra metade indicada pelo congresso atual, profundamente deslegitimado. Com isso, as classes dominantes querem restringir a participação popular. Os setores populares fazem campanha por uma “convenção constitucional” totalmente eleita, com paridade de gênero e cotas de representação para os povos originários.
- Os resultados em relação a essa segunda pergunta expressarão a correlação de forças do processo constituinte. É provável que o povo vença essa segunda pergunta, mas com que margem?
- Esse resultado é importante indicador sobre o futuro do processo. Após o plebiscito o povo será chamado a eleger “deputados” constituintes no dia 11 de abril de 2021. Esta eleição será decisiva, pois uma das regras colocadas para a convenção constituinte é o quórum mínimo qualificado de dois terços para qualquer aprovação. Este alto quórum tem objetivo de bloquear mudanças mais radicais exigidas pelo povo chileno.
- Além disso, alguns temas como os Tratados de Livre Comércio (TLC), o regime “democrático” e até o nome do país foram proibidos de serem debatidos pela assembleia constituinte (artigo 135 do acordo de paz). O que é uma grave limitação ao poder originário constituinte. Os TLCs, por exemplo, são os principais responsáveis pela manutenção e aprofundamento do modelo econômico primário exportador em vigência no Chile desde Pinochet. Logo, se os TLCs não forem revistos, o modelo econômico tende a seguir sendo o mesmo. Não se parte, portanto, de um livro completamente em branco.
- Para fazer frente a esses desafios o povo chileno precisa de forças e organização para: i) garantir com ampla margem uma assembleia constituinte totalmente eleita para este fim no próximo domingo; ii) eleger mais de dois terços de representantes constituintes no próximo 11 de abril; e iii) pressionar para reverter no atual Congresso, na Convenção Constitucional ou na Corte Suprema, as ilegítimas limitações impostas ao poder constituinte pelo artigo 135.
Depois de derrotarmos Macri na Argentina e o golpe na Bolívia é hora de derrotar a direita também no Chile.
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