O que esperar da Semana Laudato Si’

As festividades para marcar o aniversário de cinco anos da importante encíclica do Papa Francisco sobre o ambiente começam neste fim de semana, mas não do modo que se previa originalmente.

A reportagem é de Brian Roewe, publicada em National Catholic Reporter, 15-05-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Com o planeta ainda lutando contra a pandemia do coronavírus, uma Semana Laudato Si’ mais moderada e principalmente digital começa no dia 16 de maio e termina no dia 24. O evento de nove dias promovido pelo Vaticano comemorará a encíclica social Laudato Si’, de 2015, sobre o cuidado da casa comum – a primeira carta papal focada inteiramente nos ensinamentos da Igreja Católica sobre o ambiente e a ecologia humana.

No início de março, Francisco convidou o 1,2 bilhão de católicos do mundo a participarem da Semana Laudato Si’, dizendo: “Renovo meu apelo urgente a responder à crise ecológica. O grito da Terra e o grito dos pobres não podem mais esperar”.

O tema da semana é “Tudo está interligado”, uma mensagem central na encíclica que ficou ainda mais clara à medida que o novo coronavírus gerou consequências dramáticas para todos os aspectos da vida em todo o mundo.

Originalmente, os organizadores imaginaram a semana como uma mobilização em massa de católicos, no início daquela que os cientistas disseram ser uma década crucial para enfrentar as mudanças climáticas. Mas, em vez dos apelos pelo aumento da proteção ambiental vindos das multidões reunidas na Praça de São Pedro ou em praças e paróquias em todo o globo, a maioria das celebrações ocorrerá online, como ocorreu no mês abril para o 50º Dia da Terra.

“Não foi fácil adaptar, mas conseguimos”, disse Tomás Insua, diretor executivo e fundador do Movimento Católico Global pelo Clima, um dos principais organizadores da semana.

Semana Laudato Si’ é promovida pelo Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral do Vaticano, liderado pelo cardeal Peter Turkson. Mais de 100 organizações católicas em todo o mundo assinaram como parceiros, entre elas inúmeras ordens religiosas, capítulos da Caritas Internationalis, agências de desenvolvimento e Conferências Episcopais.

O site da Semana Laudato Si’ lista os eventos oficiais [disponível aqui], assim como inúmeros outros planejados pelos grupos parceiros. Muitos solicitam um cadastro online, e alguns serão transmitidos ao vivo na página do Facebook do Movimento Católico Global pelo Clima.

A programação principal da semana começa com um retiro online de dois dias, 16 e 17 de maio, dirigido por Insua. A semana termina no dia 24 de maio, com um dia global de oração ao meio-dia em todo o mundo, em que todos usarão uma oração compartilhada para o aniversário.

Oração comum para o 5º aniversário da encíclica Laudato si’ (Foto: Semana Laudato Si’)

Francisco assinou a sua primeira encíclica, uma carta papal de autoridade, no dia 24 de maio de 2015. Ela foi divulgada ao público no dia 18 de junho daquele ano.

Contínua relevância

No dia 18 de maio, a ex-chefe climática das Nações UnidasChristiana Figueres, se juntará ao Pe. Augusto Zampini, secretário adjunto do dicastério, para examinar o impacto da Laudato Si’ até agora e a sua contínua relevância para as atuais crises ecológica e sanitária. Figueres atuou como secretária executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima durante as negociações da cúpula climática COP-21, em 2015, que resultou no Acordo de Paris – o pacto global para reduzir as emissões de gases do efeito estufa e para limitar o aumento da temperatura em 1,5ºC.

Outros oradores incluem Mary Evelyn Tucker, chefe do Yale Forum on Religion and Ecology, e Yeb Sano, ex-negociador climático das Filipinas e atualmente diretor executivo do Greenpeace do Sudeste Asiático.

As formações, seminários e oficinas online ao longo da semana se focarão na ecoespiritualidade, sustentabilidade, luta e ação social. Os temas são todos orientados para a ação, disse Insua ao EarthBeat, oferecendo aos participantes estudos de caso de iniciativas bem-sucedidas no cuidado da criação, além de dicas sobre como replicá-las.

Os organizadores esperam que as lições aprendidas durante a semana possam ser postas em ação ainda este ano, durante a Semana da Criação (1º de setembro a 4 de outubro), quando as paróquias já poderão ter sido reabertas e os encontros presenciais poderão ser mais possíveis.

A pandemia não alterou apenas o cronograma da Semana Laudato Si’, mas também parte do seu tema.

Um guia de reflexão do Vaticano sobre o coronavírus [disponível aqui] aplica as lições da encíclica à atual crise de saúde, retornando à sua interconectividade de tantas questões sociais. O guia descreve semelhanças entre a pandemia e a crise ecológica, por exemplo o seu alcance global, a exposição de injustiças sociais subjacentes e a necessidade de um esforço conjunto para encontrar soluções.

“A Semana Laudato Si’ nos ajuda a reformular o nosso mundo que surgirá após o fim da pandemia. A crise atual é uma oportunidade para começar de novo, e para garantir que o mundo que for surgir após a crise seja sustentável e justo”, afirma o guia.

Bispos mobilizados

Além dos eventos oficiais, muitas paróquias, congregações religiosas e dioceses organizaram suas próprias atividades online.

Conferência dos Bispos dos Estados Unidos, um dos parceiros oficiais da Semana Laudato Si’, produziu uma série de guias de estudo, subsídios litúrgicos e homiléticos para auxiliar párocos, paróquias e famílias a refletirem sobre a encíclica, assim como sobre a “Querida Amazônia”, a exortação apostólica de Francisco sobre o Sínodo Amazônico. Reflexões diárias por e-mail oferecerão formas de rezar, aprender e agir em torno do cuidado da criação.

Além disso, a Conferência produziu um cartão postal que chama os católicos a cuidarem da criação e os convida a aprenderem mais “como a crise climática é uma questão moral profunda que afeta muito os pobres e os vulneráveis”.

“Baseados na nossa tradição católica, agora é a hora de proteger a terra para os nossos filhos e netos”, diz o cartão.

A Conferência realizará duas mesas-redondas virtuais de bispos, que discutirão como a encíclica tem sido recebida e implementada na Igreja dos EUA.

A primeira será no dia 20 de maio e incluirá o arcebispo Paul Coakley, presidente da Comissão de Justiça Doméstica e Desenvolvimento Humano, o bispo de San DiegoRobert McElroy, e o bispo auxiliar de Los Angeles Robert BarronMarianne Comfort, coordenadora de justiça das Irmãs da Misericórdia, será a moderadora.

Uma segunda mesa-redonda em espanhol será realizada no dia 18 de junho. Os bispos desse painel ainda não foram confirmados. As mesas-redondas serão transmitidas ao vivo na página sobre ambiente da Conferência dos Bispos dos EUAaqui.

Nos próximos meses, a Conferência Episcopal lançará um programa Laudato Si’ para treinar jovens católicos para compartilharem a mensagem da encíclica e promoverem a proteção do ambiente. Antes do confinamento pelo coronavírus, a equipe da Conferência Episcopal planejava usar o aniversário da Laudato Si’ como uma ocasião para briefings de políticas com parlamentares do Congresso sobre questões ambientais – incluindo um jantar em abril com o bipartidário Senate Climate Solutions Caucus –, todos cancelados.

Jovens mobilizados

Catholic Climate Covenant projetou o seu programa “Earth Day”, a ser usado também durante a Semana Laudato Si’. Junto com isso, pediu que os católicos, e particularmente os estudantes e os jovens adultos, se unam à sua campanha nas mídias sociais “Hope for Creation”, enviando orações, textos, artes e vídeos “que elevam o nosso amor e esperança pela grande criação de Deus”.

No mês passado, as Irmãs da Misericórdia lançaram o “Mercy Earth Challenge”, a chamada “maratona de mudança de um ano de duração” nos hábitos de vida, como reduzir o desperdício e viver de modo mais simples como uma forma de celebrar o aniversário da Laudato Si’. A cada semana do desafio, as irmãs destacam uma passagem da encíclica e fornecem um passo de ação que as pessoas podem dar.

Na Diocese de San Diego, a teóloga Maureen Day liderará uma reflexão no sábado sobre a declaração pastoral dos bispos da Califórnia sobre a encíclica. A diocese também planejou quatro sessões de formação online para auxiliar as paróquias na formação de equipes de cuidado da criação.

União Internacional das Superiores Gerais, o grupo de religiosas que representa 450.000 irmãs católicas em todo o mundo, liderará um rito de oração online na terça-feira, em inglês e em espanhol, sobre o tema “Tudo está interligado na rede da vida”.

Geração Laudato Si’, o ramo jovem do Movimento Católico Global pelo Clima, realizará uma oficina online no dia 21 de maio sobre como fazer compostagem em casa. Eles também participarão no fim do mês das conversas do Café Laudato Si’, que ocorrem na página do Facebook em espanhol do movimento.

Franciscan Action Network realizará um seminário online no dia 19 de maio, em que seu diretor executivo, Stephen Schneck, examinará os temas franciscanos na encíclica e na “teologia da ação” que dela emerge.

Assim como na programação principal da Semana Laudato Si’, muitos católicos têm feito conexões com o apelo urgente da encíclica a uma conversão ecológica diante das circunstâncias levantadas pela pandemia.

Maryknoll Office for Global Concerns divulgou nessa semana o seu guia de políticas sobre mudanças climáticas, parte de uma série de instruções aos fiéis antes das eleições presidenciais de 2020 nos EUA. Nele, eles destacam as consequências globais trazidas pelas mudanças climáticas, citando Figueres, ex-chefe climática da ONU, que diz: “Algumas pessoas pensavam que estariam imunes a crises globais como as mudanças climáticas, que estão se desenrolando ‘do outro lado do mundo’. [Com a crise da Covid-19], eu acho que essa bolha estourou”.

No Canadá, os católicos prepararam uma carta pública ao primeiro-ministro, Justin Trudeau, para marcar o aniversário da Laudato Si’, instando o país a planejar sua recuperação pós-pandemia por meio de uma transição justa para uma economia de baixo carbono.

“À luz desse aniversário, como uma comunidade de fiéis católicos, estamos assumindo o compromisso de moldar as nossas escolhas individuais e comunitárias de acordo com o cuidado de toda a Criação. Urgimos o governo canadense a se unir a esse compromisso e a tomar medidas concretas imediatas para achatar o curva do aquecimento global e para se mover na direção de um futuro justo e sustentável”, afirma a carta organizada pelo Joint Ecology Ministry, uma coalizão de comunidades religiosas.

Leah Watkiss, diretora do ministério de justiça social, paz e cuidado da criação das Irmãs de São José de Toronto, disse ao EarthBeat que a sua comunidade acha importante que os católicos façam esse apelo agora, enquanto a pandemia mortal se desdobra em meio aos principais marcos da Laudato Si’ e do Dia da Terra.

“Coisas que diríamos que eram impossíveis há alguns meses estão acontecendo todos os dias”, disse Watkiss. “Tudo é possível, assim como a nossa responsabilidade como cidadãos da Terra de fazer a pergunta: ‘O que vem a seguir e como podemos agir em relação a isso?’”.

fonte: http://www.ihu.unisinos.br/599035-o-que-esperar-da-semana-laudato-si


 

No aniversário da Laudato Si’, católicos e protestantes refletem sobre o bem comum

Católicos e protestantes marcaram o quinto aniversário da encíclica sobre o meio ambiente escrita pelo Papa FranciscoLaudato Si’, com a mensagem de que, embora o coronavírus não tenha relação direta com as mudanças climáticas, para as pessoas de fé o principal na superação destes dois desafios está na priorização do bem comum.

Nesta quarta-feira, 13 de maio, Dom Gregory Parkes, da Diocese de São Petersburgo, na Flórida, propôs um diálogo on-line entre lideranças católicas e evangélicas sobre as respostas pró-vida ao coronavírus, sobre outros surtos (atuais e futuros) de doenças e sobre as mudanças climáticas. No diálogo, Parkes disse aos convidados que “não estamos sós nesta situação, mas nos unimos em seus efeitos”.

A reportagem é de Christopher White, publicada por Crux, 14-05-2020. A tradução é de Isaque Gomes Correa.

O bispo citou a carta pastoral do papa de 2015, onde este diz que a maioria das pessoas no planeta Terra são pessoas de fé e devem dialogar em conjunto para proteger a natureza. Nesse sentido, disse ele, tanto o coronavírus quanto as mudanças climáticas exigem que as pessoas de fé se unam, sejam mais compassivas e mais caridosas.

Sabrina Burton Schultz, diretora do Ministério da Vida, Justiça e Ajuda, da Diocese de São Petersburgo, reiterou as observações de Parkes referenciando uma pesquisa recente do Ipsos [instituto americano de estudos de mercado] que constatou que 60% dos americanos acreditam que as mudanças no clima serão uma ameaça tão séria quanto a Covid-19.

Em particular, ela observou que a poluição do ar exacerba as doenças respiratórias e eleva drasticamente as taxas de mortalidade da Covid-19, acrescentando que essa é uma área na qual os líderes religiosos podem trabalhar juntos no curto e longo prazo.

Sandra Gompf, professora de doenças infecciosas na Faculdade de Medicina da Universidade do Sul da Flórida, em Tampa, citou uma série de estatísticas para mostrar um aumento da devastação ecológica, desde o aumento da temperatura que altera o habitat de insetos que são vetores de doenças humanas até o aumento da perturbação dos padrões climáticos, gerando mais furacões. A professora alertou que estes não são problemas apenas enfrentados por outros países, mas que são temas locais e que estão sendo ignorados nos EUA.

Rev. Mitchell Hescox, presidente e CEO da Rede Ambiental Evangélica, lembrou os participantes do encontro on-line que “o cuidado da criação é uma questão de vida”.

“Tudo o que colocamos na criação de Deus que não deveria estar aí”, disse Hescox, “volta e impacta a vida humana”.

Segundo ele, aproximadamente 200 mil pessoas morrem a cada ano de poluição do ar proveniente de combustíveis fósseis, acrescentando que temperaturas mais quentes e mais poluição atmosférica significam que “as coisas estão piorando – e não melhorando – e que precisamos agir agora para superar”.

Mesmo assim, segundo Hescox, “não devemos nos sentir desamparados”, lembrando que ficou feliz ao ver muitos católicos instalarem painéis solares em seus ambientes.

“Não é apenas uma ótima forma de economizar dinheiro”, disse, “mas é uma ótima maneira de limpar o ar”, ao mesmo tempo que incentiva as dioceses do país a promoverem a jardinagem comunitária.

Joel Hunter, pastor da Northland Church e membro fundador da Iniciativa Evangélica do Clima, disse que o atual coronavírus é uma recordação grave dos desafios enfrentados hoje, quando somos forçados a considerar “o que acontece quando a nossa própria respiração se torna uma fonte infecciosa de poluição”.

Segundo advertiu o pastor, tanto esta pandemia quanto a crise climática em geral são um problema “grande demais para um grupo religioso sozinho resolver”.

Apesar de evangélico, Hunter disse que o Papa Francisco tem sido uma voz importante de solidariedade e cooperação, acrescentando que “a doutrina social da Igreja Católica é absolutamente maravilhosa teologicamente” e que ajuda todas as pessoas de fé a cooperarem no cumprimento do mandato original de Deus de cuidado da criação.

Da mesma forma, o Pe. George Corrigan, pastor da Igreja Católica do Sagrado Coração, em Tampa, contou aos participantes que o ensino social católico ajuda a alcançar um equilíbrio entre a pessoa humana e a comunidade ao seu redor.

Corrigan disse que se olharmos para os surtos de doenças recentes, seja na epidemia de febre amarela, seja a gripe espanhola ou a Covid-19, nenhuma teve uma vacina imediata.

“A única vacina, ou anticorpo, foi a solidariedade”, disse ele, lembrando que é disso que as pessoas de fé devem se lembrar hoje.

Corrigan pediu aos participantes do diálogo on-line que considerem a questão de que “o que fazemos afeta o florescimento humano em todos os níveis. Enquanto fazemos as nossas escolhas, estamos verdadeiramente observando o que impacta o bem comum?”, perguntou Corrigan.

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fonte: http://www.ihu.unisinos.br/599024-no-aniversario-da-laudato-si-catolicos-e-protestantes-refletem-sobre-o-bem-comum

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