Bolsonaro renova sua parceria com a morte

No fim de semana em que óbitos bateram novo recorde e sistema de saúde entrou em colapso em novos estados, presidente exortou população a desrespeitar medidas protetivas. E mais: 5 milhões de testes PCR incinerados por negligência

OUTRASAÚDE

Publicado 01/03/2021 às 07:51

Por Raquel Torres| Imagem: Aroeira

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ELE NÃO DESISTE

A média móvel de mortes por covid-19 no Brasil bateu mais um recorde ontem, ficando em 1.208 óbitos diários. Praticamente o país inteiro está indo de mal a pior: em 17 capitais, a taxa de ocupação das UTIs ultrapassa os 80%. Entre os estados, são 12 nessa mesma situação. 

Temos acompanhado nos últimos dias a decisão de gestores locais de aumentarem suas medidas de restrição; e, segundo o Painel da Folha, governadores e secretários estaduais de saúde estão pedindo a Eduardo Pazuello que seja adotada uma “medida única” em todo o país. O jornal diz que representantes do ministério da Saúde reconhecem essa necessidade, mas afirmam que se trata de uma missão impossível, porque “Jair Bolsonaro não deixa”

Se a campanha anti-prevenção sempre foi forte por parte do presidente, neste fim de semana ele renovou seus ataques, centralizando as provocações nos governos locais. Na sexta-feira, esteve no Ceará e disse que o novo auxílio emergencial só será pago por mais alguns meses e, daí por diante, os governadores que “fecharem seus estados” é que devem bancá-lo. A fala aconteceu em meio a uma aglomeração, é claro.

No Distrito Federal, o anúncio de um lockdown levou uma horda de bolsonaristas até a casa do governador. Portando muitas faixas e cartazes (mas poucas máscaras), eles pediam o fim do decreto – e qualquer coincidência com o que aconteceu em Manaus em dezembro do ano passado, dias antes do colapso, não é mera coincidência. 

Bolsonaro não perdeu tempo e compartilhou imagens em suas redes sociais. Os revoltosos venceram: o governador do DF, Ibaneis Rocha, publicou novo decreto amaciando as regras, e agora vários estabelecimentos, incluindo igrejas, vão poder funcionar normalmente. Mas, ao contrário do que aconteceu no Amazonas, shoppings, bares e comércio em geral não foram contemplados. Menos mau.

Ontem, o presidente se reuniu com os presidentes da Câmara e o Senado, junto com vários ministros, para tratar de “vacina, auxílio emergencial; PEC Emergencial, emprego e situação da pandemia”, segundo um post de Bolsonaro. O Estadão apurou que o encontro serviu para contar votos para a aprovação da PEC, cuja votação está marcada para o dia 3. A fotografia do encontro é ridícula: dos sete presentes, só Paulo Guedes, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira usam máscaras. Bolsonaro e seus ministros generais, incluindo o da Saúde, não usam proteção.

Em tempo: a discussão sobre a abertura de uma CPI para investigar a atuação do governo na pandemia ainda está em pauta no Senado. O jornalista Guilherme Amado, da Época, conseguiu mensagens de WhatsApp de oito parlamentares defendendo não só a CPI como o impeachment, logo após a visita de Bolsonaro ao Ceará. São de oito legendas: PSD, MDB, PT, Cidadania, Rede, PROS, Podemos e Republicanos. 

MEDO VERDADEIRO

Ontem Jair Bolsonaro voltou a gritar contra os fechamentos, escrevendo no Facebook em letras garrafais: “HOJE, ao FECHAREM O COMÉRCIO e novamente te obrigar a FICAR EM CASA, vem o DESEMPREGO EM MASSA com consequências desastrosas para todo o Brasil”.

Desnecessário dizer que esse argumento encontra eco na população. E não sem razão de ser, já que a necessidade de se manter financeiramente é real. Um levantamento do Instituto Travessia para o Valor indica que 11% das mil pessoas entrevistadas precisaram cortar até a compra de itens básicos em 2020, mesmo tendo havido auxílio emergencial. Quando perguntadas sobre sua maior preocupação para 2021, 38% citaram o desemprego. Foi o maior medo, seguido por “segurança” (18%), “inflação” (15%), “falta de vacina” (14%), “piora no atendimento a pacientes com covid” (8%) e “crise política” (7%).

Não por acaso, a pesquisa mostra que a defesa de medidas severas caiu: em abril de 2020, 57% queriam o amplo fechamento do comércio e outras restrições à mobilidade. Agora, são 39% e, em contraste, 52% defendem um “isolamento parcial”. Para o azar do presidente, isso não significa que essas pessoas estejam de acordo com sua condução na pandemia. Ao contrário, 66% disseram não confiar na sua capacidade de gerenciar a crise.

Enquanto isso, entramos no terceiro mês sem auxílio emergencial.

VÃO VIRAR PÓ

Há mais de quatro meses, o país se indignou diante da notícia de que havia sete milhões de testes PCR encalhados em um armazém do governo federal em Guarulhos/SP. Como eles perderiam a validade em breve, foi feito um malabarismo para esticar esse prazo. E o que aconteceu de lá para cá? Só dois milhões de unidades foram distribuídas aos estados, apesar de a necessidade de testagem ser muito maior do que isso. Falta dar cabo de 4,7 milhões e, se não houver destino para elas, terão que ser incineradas entre 21 de abril e o começo de junho, diz o Estadão. 

É inacreditável. A equipe do general Eduardo Pazuello chegou a negociar o envio de um milhão de testes para o Haiti, mas nem isso será possível. Segundo o jornal, devem ser doadas só 30 mil unidades. Isso porque o material vai estragar logo e seu uso exige outros insumos, como swabs, tubos coletores e reagentes, que não necessariamente estarão disponíveis no país. 

UMA EXPLICAÇÃO

Cientistas da Fiocruz Amazônia estudaram a variante do coronavírus originada em Manaus, a P.1, e chegaram a uma conclusão que pode explicar por que ela se espalha tão rápido: sua carga viral é dez vezes maior em adultos infectados por ela do que por outras variantes. O trabalho, que ainda não foi revisado por pares, analisou 250 amostras genômicas colhidas entre março do ano passado e janeiro deste ano, então engloba tanto a primeira quanto a segunda ondas.

“Se a pessoa tem mais carga viral nas vias aéreas superiores, a tendência é que ela vai estar expelindo mais vírus – e, se ela está expelindo mais vírus, a chance de uma pessoa se infectar próxima a ela é maior”, explica Felipe Naveca, líder do estudo. Ele aponta, porém, que isso não está relacionado à gravidade da doença. 

ÓTIMA OPÇÃO

A FDA (agência reguladora dos Estados Unidos) aprovou no sábado a vacina da Janssen, do grupo Johnson & Johnson. É o terceiro imunizante contra a covid-19 que passa a ser autorizado no país, junto com os da Pfizer e da Moderna. A diferença mais importante desse produto para os outros aprovados até agora é que seus resultados se referem a um regime de dose única. A eficácia não é das maiores, mas é bastante boa: ficou em 66% no geral, 72% nos EUA e 57% na África do Sul. A proteção contra formas graves da doença ficou em 85%.

Essa é uma vacina que deveria estar no radar brasileiro há muito tempo, mas o país não fechou nenhum acordo de compra. No resto do mundo, já são ao menos 800 milhões de doses encomendadas: 500 milhões para a Covax Facility (talvez alguma coisa chegue ao Brasil por essa via), pelo menos 100 milhões para os EUA e o restante para Reino Unido, União Europeia e Canadá. Neste fim de semana a África do Sul também assinou um acordo para receber 11 milhões de doses.

Mesmo que o Brasil se mexesse para fechar algum negócio agora, provavelmente levaria muito tempo até ter o produto em mãos. Por enquanto, só há ao todo 3,9 milhões de doses disponíveis para entrega, e esperam-se outras 16 milhões até o fim de março. 

POSSÍVEL MARCO

Cuba pode se tornar o primeiro país latino-americano a conseguir um imunizante eficaz contra a covid-19. Seus laboratórios estão trabalhando em nada menos quatro candidatas, e duas vão entrar na fase 3 dos testes clínicos nos próximos dias: a Soberana 02 e a Abdala. Nos ensaios de fase 2, ambas se mostraram seguras e levaram à produção de anticorpos específicos. 

“Não é um milagre: há um notável desenvolvimento científico em Cuba e 30 anos de experiência na fabricação de vacinas”, diz, no El País, o vice-presidente do grupo empresarial cubano BioCubaFarma, Eulogio Pimentel. Ele lembra ainda que o país foi o primeiro a desenvolver e fabricar uma vacina meningocócica, nos anos 1990, e uma contra a hepatite B.

A ilha tem 11,3 milhões de habitantes e espera produzir 100 milhões de doses das vacinas ainda em 2021. Isso significa que, se tudo der certo,  vai conseguir imunizar a população inteira ainda este ano, exportar o produto e até  aplicar doses em turistas internacionais, como já foi anunciado. 

WORKSHOP PARA JORNALISTAS

O Idec e o Outra Saúde vão promover um curso gratuito para jornalistas sobre acesso a medicamentos e vacinas no Brasil. Para participar, basta estar vinculado a qualquer veículo de comunicação e preencher este formulário até a quarta-feira, dia 3. As vagas são limitadas.

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Com país à beira do colapso nas UTIs, Bolsonaro minimiza: “saúde sempre teve problemas”

Enquanto o país bate novo recorde na média móvel de mortes por coronavírus e mais da metade dos estados brasileiros estão à beira do colapso nas UTIs, Bolsonaro honra seu negacionismo e minimiza o caos na saúde em meio ao pior momento da pandemia no Brasil.

Esquerda Diário

segunda-feira 1º de março| Edição do dia

Imagem: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Nesta última semana, o Brasil bateu novo recorde na média móvel de mortes, com 1.208 óbitos por COVID nos últimos sete dias. Ainda, nesse momento, mais da metade dos estados brasileiros estão com taxas de internação por COVID-19 acima de 80% nas UTIs da rede pública de saúde.

Os números e os relatos dos trabalhadores da saúde não deixam dúvidas: estamos no pior momento da pandemia no país. Mesmo assim, honrando seu negacionismo, o presidente Bolsonaro escreveu em suas redes ontem (28) que “A saúde no Brasil sempre teve seus problemas. A falta de UTIs era um deles e certamente um dos piores”. Grande demagogia.

Veja também: Colapso nas UTIs, crianças morrendo e desemprego, mas pioridade de governos são reformas

Já estamos há 1 ano desde o começo da pandemia no Brasil e se a falta de UTIs sempre foi um problema, já deveria estar resolvido. Ao contrário disso, o governo de Bolsonaro e Mourão não utilizou toda verba destinada para o combate ao coronavírus.

A verdade é que o governo federal, junto do conjunto dos golpistas, do Congresso e do STF, prioriza o pagamento da fraudulenta e ilegítima dívida pública e a implementação de reformas e ataques aos trabalhadores em detrimento da vida da população. Para comprar votos dos congressistas, dinheiro público é destinado facilmente, para salvar vidas não.

fonte: http://www.esquerdadiario.com.br/Com-pais-a-beira-do-colapso-nas-UTIs-Bolsonaro-minimiza-saude-sempre-teve-problemas

 

 

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