Sobre o lançamento do “Conselho para o Capitalismo Inclusivo com o Vaticano”. Nota da Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara
“O sistema capitalista é, em sua essência, acumulador e concentrador; logo, mesmo que os seus agentes 'não queiram', ele gera desigualdade e exclusão, além de destruir a natureza”, manifesta a Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara - ABEFC sobre a criação do Conselho para o Capitalismo Inclusivo com o Vaticano, em artigo para a coluna "Rumo a Assis: na direção da Economia de Francisco".
Eis a nota.
“Água seca, carvão limpo, gelo quente, nazismo fraterno, capitalismo inclusivo”
São contraditórias e estranhas as correlações feitas acima, mas foi dessa forma que recebemos a notícia do lançamento do “Conselho para o Capitalismo Inclusivo com o Vaticano” no último dia 8 de dezembro.
A recepção promovida pelo cardeal Peter Turkson, Prefeito da Congregação para o Desenvolvimento Humano Integral, a qual pôs o Papa Francisco em diálogo com o assim chamado Conselho, não configura o primeiro encontro; pelo contrário, tais reuniões já vêm ocorrendo há alguns anos.
A contradição e a estranheza residem no fato de corporações de lucros exponenciais, grandes atores globais da acumulação, reprodução, concentração e centralização capitalistas, reunirem-se com o Vaticano com a suposta intenção de reduzir a desigualdade e a exclusão, e puxando a bandeira da “salvação do capitalismo”.
Para nós, é curioso perceber que, para combater e superar as injustiças socioeconômicas e ambientais, esse Conselho proponha a bandeira da salvação de um sistema que, paradoxalmente, seja capitalista e, ao mesmo tempo, “inclusivo”.
A Economia de Francisco foi recebida pelo mundo inteiro como um fruto de tudo o que vem sendo apontado pelo magistério do próprio Papa Francisco nesse sentido. Ele mesmo já denunciou que “essa atual economia mata” (EG, n. 53), porque “os lucros de muitos crescem exponencialmente, enquanto os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar” (EG, n. 56). De fato, o sistema capitalista é, em sua essência, acumulador e concentrador; logo, mesmo que os seus agentes “não queiram”, ele gera desigualdade e exclusão, além de destruir a natureza.
Para nós, essa movimentação se pauta no autointeresse que visa “a salvação dos bancos a todo custo” (LS, n. 189), e o uso de seus recursos financeiros em favor da velha política de manutenção do poder. A Economia de Francisco e Clara aponta para a necessidade do “desenvolvimento de uma nova economia mais atenta aos princípios éticos e para uma nova regulamentação da atividade financeira” (LS, n. 189), que esteja a serviço da vida, sobretudo a dos mais pobres, e do cuidado da natureza.
Assim, repudiamos qualquer discurso que afaste os povos do foco na real superação das dores deste mundo. Entrelaçamo-nos com os movimentos populares, que entendem “a solidariedade no seu sentido mais profundo, e assim fazem história” (FT, n.116), em busca do bem viver numa terra sem males. Cremos que essa realidade virá através de uma economia orientada para a justiça, bem como de um sistema político pautado na solidariedade, e que harmonize as dimensões social, ambiental e econômica em vista do efetivo protagonismo dos pobres neste novo tempo.
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Economia de Francisco e Clara em linguagem acessível, elucidativa e popular. Nota de Frei Marcelo Toyansk Guimarães
Diante da destruição ambiental, do desemprego crescente, da fome voltando, do desmonte dos direitos… enquanto a riqueza cada vez mais nas mãos de poucos, o Papa Francisco vem dizer ser urgente “repensar” essa economia que mata e depreda, inspirando-se, para isso, em Francisco de Assis, por meio de um grande encontro, que tem sido um movimento mundial, chamado por ele de “Economia de Francisco”. No Brasil, alguns frades capuchinhos da “Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara” elaboraram um panfleto para tornar mais acessível e em uma linguagem popular esses desafios da atual situação crítica econômica, dialogando igualmente com Francisco de Assis.
O panfleto, que contou com 40 mil impressos e ampla divulgação on-line, pode ser utilizado em grupos para refletir e propor iniciativas por uma nova economia. Pode ser também um subsídio a diversos espaços e provocar uma nova visão da economia, denunciando que os grandes bancos vêm sugando, através de elevados juros, a economia das famílias, das empresas e do Estado, engessando toda a economia, como bem elucida o economista Ladislau Dowbor em seus livros e conferências. Não é simplesmente o desvio de verbas de políticos que tem afundado a economia brasileira, muito antes são os juros usurpadores de intermediários financeiros, que sugam trilhões sem produzir praticamente nada, nem gerar empregos, como bem mostra, por imagens e textos, o nosso panfleto.
O texto é de frei Marcelo Toyansk Guimarães, OFMCap (Comissão Justiça, Paz e Integridade da Criação dos Frades Capuchinhos do Brasil) e a arte de frei Cássio Augusto Almeida, OFMCap, com a revisão dos economistas Ladislau Dowbor e Odilon Guedes, em artigo para a coluna "Rumo a Assis: na direção da Economia de Francisco".


Imagem: Panfleto de divulgação do evento "Economia de Francisco".
Eis o texto.
Economia de Francisco e Clara
“Economia de Francisco” é o grande encontro e articulação convocados pelo Papa Francisco para “repensar” a atual economia que destrói o meio ambiente, aumenta o desemprego e a pobreza e concentra a riqueza cada vez mais nas mãos de poucos super-ricos. Este Encontro ocorreu em 19-21 de novembro de 2020, na modalidade on-line, junto com o Papa, que o chama de “Economia de Francisco” em referência a Francisco de Assis, e ano que vem acontece presencialmente, em Assis, Itália. Para tanto, o Papa convoca a todos para uma economia mais justa, sustentável e sem exclusão de ninguém. É uma proposta de sobrevivência, pois a economia atual está levando o Planeta e a humanidade ao colapso.
* Hoje a riqueza do mundo poderia propiciar a toda família, no Planeta, renda de 12 mil reais por mês! Mas 800 milhões de pessoas passam fome no mundo e 6 megabilionários têm a mesma riqueza que 3,5 bilhões de pessoas! Não é simplesmente a pandemia que está trazendo a pobreza e desemprego crescentes, mas o acúmulo da riqueza nas mãos de bilionários, que mesmo neste tempo de pandemia estão se enriquecendo.
* No Brasil, hoje, as famílias pagam 100% de juros ao ano nas compras a prazo (na Europa, são de 5%). São mais de 60 milhões de endividados em nosso país!
* No Brasil, para as empresas, os juros são de 50% ao ano (na Europa, são de 2%)!
* Famílias e pequenas empresas, assim, pagam R$ 1 trilhão de juros ao ano aos bancos (www.dowbor.org).
* O Estado brasileiro, por meio dos juros da dívida pública (com inúmeras irregularidades), paga anualmente mais R$ 1 trilhão aos bancos e aos aplicadores do mercado financeiro, 40% de toda a receita do país (www.auditoriacidada.org.br)!
* O dinheiro está muito concentrado nas mãos dos banqueiros, as famílias não conseguem comprar, as empresas não vendem, o Estado não investe: aqui está a crise do Brasil!
* Nos últimos 7 anos, o número de bilionários triplicou no Brasil. Em 2012, eles possuíam R$ 340 bilhões e hoje têm R$ 1,2 trilhão. E no início da pandemia, o governo, através do Banco Central, repassou, escandalosamente, mais de 1 trilhão aos bancos e o sistema financeiro, sem praticamente nenhuma contrapartida (www.auditoriacidada.org.br)!
* Esses bilionários não produziram nada a mais, nem geraram empregos, só sugam a riqueza pelos altos juros. Eles retiram esse dinheiro dos impostos e dos pobres, com graves cortes na saúde, educação, aposentadoria e habitação!
Por outro lado, o dinheiro, quando está no meio do povo, circula muito, as famílias compram e usam serviços, gera empregos, o Estado arrecada mais e isso tudo desenvolve o país. O Papa, por isso, diz ser urgente “trazer alma” às relações econômicas, pois, do jeito que hoje elas estão, matam as pessoas e devastam o Planeta. Uma nova economia requer uma grande mudança no pensar, com o ser humano e o meio ambiente no centro das preocupações. Diante de tudo isso, não podemos aceitar o desmonte das políticas públicas. Precisamos promover economias solidárias e bancos comunitários, organizar articulações locais e regionais, lutar pela distribuição de renda e justiça social e, assim, participarmos da Economia de Francisco e Clara.
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fonte: http://www.ihu.unisinos.br/605766-economia-de-francisco-nota-de-frei-marcelo-toyansk-guimaraes